Dissociar o Estado das corporações e associar ciência e política

Luís Marques

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Em 1972, Barbara Ward e René Dubos escreveram, por encomenda de Maurice Strong, o documento preparatório para a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano realizada naquele ano em Estocolmo. Esse documento foi publicado na forma de um livro, intitulado Only One Earth: The Care and Maintenance of a Small Planet. Seu primeiro capítulo concluía-se com essas palavras lapidares:

“Os dois mundos do homem – a biosfera de sua herança, a tecnosfera de sua criação – estão em desequilíbrio, na realidade, potencialmente em profundo conflito. E o homem está no meio. Esse é o ponto de inflexão da história, em que nos encontramos, com a porta do futuro abrindo-se para uma crise mais súbita, mais global, mais inescapável e mais desconcertante que qualquer outra jamais confrontada pela espécie humana. Uma crise que tomará sua forma decisiva no intervalo de vida das crianças já nascidas.”

Paralelamente a esse livro seminal de Ward e Dubos, e visando igualmente interagir com a Conferência de Estocolmo, um manifesto assinado por mais de 30 cientistas eminentes, entre os quais Julian Huxley, Frank Fraser Darling, Peter Medawar e Peter Scott, publicava em janeiro de 1972 A Blueprint for survival. O impacto desse documento foi então imenso, como o atestam as 750 mil cópias vendidas da revista The Ecologist de Edward Goldsmith, que o redigiu e publicou. Sua mensagem é idêntica à de Only one Earth, nomeadamente no que se refere ao prognóstico temporal de desfecho dessa crise ambiental: “no intervalo de vida das crianças já nascidas” (I):

“O principal defeito do modo de vida industrial, com seu ethos expansivo, é que ele não é sustentável. Seu término no intervalo de vida de alguém nascido hoje é inevitável – a menos que seja mantido ainda um pouco mais por uma minoria entrincheirada ao custo de impor grande sofrimento ao resto da humanidade”.

A ciência em que se baseava a assertividade e a projeção temporal pioneira desses dois documentos nada tinha de sua maturidade e robustez atuais. Também ela, por certo, era pouco mais que uma criança recém-nascida. De modo que ambos os documentos não avançavam projeções quantitativas sobre a evolução dessas crises. Podiam já prever, entretanto, que a Geração X, nascida entre a metade dos anos 1960 e a segunda metade do anos 1970,  seria a primeira testemunha e vítima de uma crise ambiental “mais súbita, mais global, mais inescapável e mais desconcertante que qualquer outra jamais confrontada pela espécie humana”. Previam também o fim de nosso modelo insustentável de civilização, “a menos que [esse modelo] seja mantido ainda um pouco mais por uma minoria entrincheirada ao custo de impor grande sofrimento ao resto da humanidade”. Rupturas socioambientais maiores viriam a ocorrer, portanto, segundo esses dois documentos, no intervalo de vida das crianças nascidas nos anos 1960, vale dizer, grosso modo até os anos 2030, rupturas que uma “minoria entrincheirada” tentaria denegar e postergar ao máximo, impondo um sempre maior sofrimento ao resto da humanidade.

“Mais rápido que previsto”

A capacidade preditiva desses dois documentos é indubitável. Passados quase cinquenta anos, a ciência não cessa de se surpreender com a velocidade crescente com que os fenômenos se antecipam às projeções. Em 2007, o IPCC (AR4) afirmava:

“Segundo os resultados dos modelos atualmente disponíveis, a ocorrência de mudanças climáticas abruptas, tais como o colapso das geleiras da Antártica Ocidental, a rápida perda das geleiras da Groenlândia ou mudanças em larga escala nos sistemas de circulação oceânica, não é considerada provável no século XXI. Contudo, a ocorrência de tais mudanças torna-se crescentemente mais provável à medida que a perturbação do sistema climático progride” (II).

E é justamente essa sempre crescente probabilidade de descontinuidades fundamentais no sistema Terra, sobretudo no clima e na resiliência da biodiversidade, que dá o tom dos alertas da comunidade científica neste segundo decênio. Alguns poucos exemplos. Carlos Nobre e Thomas Lovejoy alertam, no editorial da revista Science Advances de 21 de fevereiro de 2018, já comentado nesta coluna (III), que o desmatamento da floresta amazônica pode estar em vias de atingir um ponto crítico, levando-a a uma rápida transição para um bioma de tipo savana (IV). A taxa de aquecimento dos oceanos dobrou desde 1992, em relação ao período precedente (1950 – 1990), algo não previsto pelos modelos (V). Desde 2007, um estudo mostrava que o declínio observado do gelo no Oceano Ártico era “mais rápido que previsto” pelos modelos então analisados pelo IPCC (VI).

Em seu quinto relatório, mesmo o IPCC, relativamente conservador, por força de seu estatuto intergovernamental e de outras circunstâncias que condicionam seu modus operandi, admite ao menos um cenário de verão sem gelo no Ártico já para 2050 (e não mais para 2100), mas há projeções que antecipam em muito esse novo estado do oceano (VII). A aceleração da perda de gelo da Groenlândia é um fato que vem surpreendendo a comunidade científica: “Ninguém esperava que as geleiras [da Groenlândia] perdessem tanta massa tão rapidamente. As coisas estão acontecendo muito mais rapidamente do que era nossa expectativa”, afirma Isabella Velicogna, num artigo publicado na Science no ano passado (VIII).

Estamos vendo agora na Groenlândia inclusive incêndios de suas turfeiras derretidas, com liberações maiores de metano e diminuição de sua reflexividade ou albedo, num típico, embora ainda incipiente, circulo vicioso: mais aquecimento, mais degelo, mais liberação de metano, mais aquecimento. Como observa Andreas Stohl, do Norwegian Institute for Air Research (NILU): “Esta é uma advertência de que algo assim pode acontecer nos pergelissolos, que se supunha estariam derretendo apenas no final do século” (IX). Enfim, por causa do aquecimento oceânico e do derretimento do gelo na Groenlândia e no Ártico, a poderosa corrente marítima que tem função crucial na manutenção do estado atual do sistema climático, a Circulação de Revolvimento do Atlântico, ou Circulação Termoalina do Atlântico (Atlantic Meridional Overturning Circulation ou AMOC), vem arrefecendo desde 2004. Esse arrefecimento, já advertido por vários cientistas (X), é objeto de recente editorial da Nature e de diversos artigos de divulgação científica que ecoam e analisam trabalhos recém-publicados (XI), mostrando justamente a ocorrência de “mudanças em larga escala nos sistemas de circulação oceânica”, fenômenos que em 2007, como visto acima, o IPCC, com base nos resultados então disponíveis, considerava improváveis no século XXI.

Os exemplos são inúmeros a ilustrar, em suma, o fato que a ciência vem hoje insistindo sobre a crescente probabilidade de cruzarmos pontos críticos no sistema Terra já nos próximos decênios, vale dizer, justamente nos anos 2030, previstos pelos dois documentos de 1972. Essa consciência hoje consensual de que os prazos fixados pelos dois documentos de 1972 estão se esgotando não deixou de crescer nesse último meio século. Ela se reflete nas declarações que sublinham a insuficiência dos resultados dos grandes encontros internacionais passados sobre o clima e o meio ambiente. Em 1992, vinte anos depois da Conferência de Estocolmo, Maurice Strong (1929-2015), presidindo as negociações da ECO-92, exortava a agir contra os interesses econômicos dominantes em face do agravamento das crises socioambientais desde 1972 (XII): “Não temos outros 20 anos para desperdiçar. Temos que tomar o caminho mais rápido a partir do Rio. (…) A principal mensagem dessa Conferência é que não se pode tratar de questões ambientais sem tratar de questões econômicas”.

Em 2012, passados os tais 20 anos e constatado o desperdício de tempo que foi o Protocolo de Kyoto e o fracasso da própria Rio+20, Ban Ki-moon, então secretário-geral da ONU, declarou: “Permitam-me ser franco. Nossos esforços não estiveram à altura do desafio. A natureza não espera. A natureza não negocia com os seres humanos” (XIII). E Pavan Sukhdev, ex-Conselheiro especial do PNUMA e chefe do projeto Green Economy Initiative da ONU, repetiu a mesma mensagem num tom ainda mais enfático: “Precisamos de ação urgente. Não podemos ter uma Rio+40. Não haverá tempo. Estamos nos comportando como idiotas. A questão do desenvolvimento sustentável não é para a próxima geração, é para a nossa” (XIV).

Não há tempo para uma Rio+40

Seis anos se passaram após a Rio+20 e estamos nos aproximando do aniversário de três anos do Acordo de Paris. E malgrado os esforços envidados para mitigar as crises ambientais – e eu seria o último a menosprezá-los –, é cada dia mais difícil tergiversar sobre o fato de que continuamos, ano a ano, a aumentar o que a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (UNFCCC) chamou de “Interferência Antropogênica Perigosa” (DAI) sobre o sistema Terra. Estamos nos distanciando a passos de gigante dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e apenas insistir em sua importância não fará nos aproximar deles. Sucessivos balanços negativos exibem o fracasso dos esforços para atingir as 20 Metas de Aichi (Aichi Biodiversity Targets) para a conservação da biodiversidade até 2020, sendo a perda de biodiversidade, como bem afirma Richard Gregory, “uma das maiores crises com que se defronta a humanidade” (XV).

No âmbito climático, continuar invocando como uma fórmula apotropaica as promessas (pledges) feitas pelos signatários do Acordo de Paris não pode e não deve mais ocultar o fato de que a tendência constatada revela o vazio dessas promessas. O Acordo de Paris não foi ainda ratificado por 13 países produtores de mais de um quarto da produção mundial de petróleo, aí incluídos a Rússia, o Iraque, o Irã e o Kuwait (XVI). Com a decisão dos EUA de abandonar o Acordo, mais de um terço da produção mundial de petróleo provém de países que não podem ser acusados, como os demais, de não cumprir o Acordo de Paris porque nem sequer o reconhecem. As emissões antropogênicas de gases de efeito estufa (GEE) montavam a cerca de 39 GtCO2-eq em 1990 e atingiram 53,4 GtCO2-eq em 2016, um aumento de 37% em apenas 26 anos, aumento que o Acordo de Paris não foi capaz de limitar em 2016, como mostra a Figura 1

Reprodução
Fonte: baseado em Trends in global CO2 and total greenhouse gas emissions: Summary of the 2017 Report, com dados do Emission Database for Global Atmospheric Research (EDGAR v4.3.2 database). PBL Netherlands Environmental Assessment  Agency.

Figura 1 – Emissões de GEE por tipo de gás e por fonte de emissão entre 1990 e 2016
Entre 2016 e 2017, as emissões antropogênicas de GEE aumentaram ainda cerca de 1,5%. Nada prenuncia sua diminuição e muito menos na velocidade requerida para evitar um aquecimento médio global superior a 2 oC. Dado o peso crescente das alças de retroalimentação na dinâmica das mudanças climáticas, é possível que esse nível “perigoso” de aquecimento seja atingido, ou mesmo ultrapassado, já no horizonte dos anos 2030 (e não mais no “longínquo” 2100), confirmando mais uma vez os prognósticos dos dois documentos de 1972 acima citados. Em todo o caso, evitar um aquecimento médio global dessa magnitude tornou-se uma impossibilidade “sociofísica”, pois suporia zerar o desmatamento e reduzir o consumo de combustíveis fósseis a uma velocidade incompatível com os paradigmas, a visão de mundo e os planos de negócios que as corporações impõem à humanidade e às demais espécies.

Duas condições de possibilidade para virar o jogo

Dissociar o Estado das corporações

Para estabelecermos uma premissa da qual partir é preciso entender que não há saída para as políticas efetivas de mitigação fora de um embate frontal e incontornável entre interesses conflitantes. É preciso, portanto, definir quem são os aliados e quem são os adversários dos esforços reais para mitigar as crises ambientais. As sociedades têm fracassado em confrontar a engrenagem devastadora do capitalismo global por causa, antes de mais nada, do crescente e sempre mais exorbitante poder das corporações sobre os Estados.

É preciso entender que esse poder é, hoje, de um novo tipo. Ele o é, antes de mais nada, em decorrência dos recursos imensos dessas corporações. Se consideradas as 28 “entidades” mais ricas do mundo – países com riquezas medidas pela renda nacional e corporações, medidas por seu faturamento –, dez dessas entidades são corporações, sendo que das 20 maiores corporações do mundo, com um faturamento total de 4,5 trilhões de dólares, nove são umbilicalmente ligadas ao petróleo e seis pertencem à esfera do Big Food (XVII). A atual interdependência entre Estado e as megacorporações – notadamente no que se refere à influência destas sobre os mercados, as finanças públicas, a informação, a energia, a mineração, a agropecuária, a agroquímica (fertilizantes e agrotóxicos), a comercialização e os preços das commodities em geral –, não se atém mais apenas às políticas econômicas, mas atinge a identidade mesma do Estado.

Esse novo Estado absorvido pela corporação, a que se pode dar o nome de Estado-Corporação, foi bem descrito em 2008 por Sheldon Wolin que cunhou o termo “Democracy Incorporated” (XVIII), caracterizada por: “uma relação simbiótica entre o governo tradicional e o sistema de governança ‘privada’ representado pela moderna corporação empresarial. O resultado é, não já um sistema de co-determinação por colaboradores que mantêm distintas identidades, mas um sistema que representa a passagem à maturidade política do poder corporativo”

Isso posto, a primeira condição de possibilidade para virar o jogo é a reconquista democrática do Estado numa perspectiva de superação do unilateralismo e de fortalecimento da governança global. Há aqui um longo caminho a trilhar, e que deve ser trilhado rapidamente, pois, como visto, não temos mais 20 anos para desperdiçar. Ele começa por abandonar de uma vez por todas o “pensamento mágico” de que uma mitigação significativa das crises ambientais pode ser capitaneada pelo mercado. Por melhores que sejam as intenções das corporações, publicitadas em Davos e em outros fóruns corporativos – a se admitir que sejam mais que simples greenwashing –, essas multinacionais não podem internalizar seus custos ambientais em seus planos de negócios. Elas estão condenadas a ser, na prática, as principais responsáveis pela destruição da biodiversidade e pela desestabilização do clima. Dado que, para elas, ser é expandir-se, sua ação inerentemente expansiva representa, objetivamente, a mais sistêmica e cumulativa ameaça à humanidade. Acreditar que as megacorporações podem ser parceiras da luta pela sustentabilidade equivale a acreditar que o agronegócio é nosso aliado nos esforços por uma agricultura orgânica e local, por uma agricultura de alimentos e não de commodities, e que a “bancada do boi” no Congresso nacional é nosso parceiro no combate ao desmatamento e na luta pela democratização da propriedade da terra.

Associar ciência e política

A própria sociedade, através de seus partidos e outras associações, é a protagonista desse processo de retomada democrática do Estado numa perspectiva de governança global. Mas esse processo passa, de qualquer modo, por uma convergência entre ciência e política porque é justamente da dissociação entre ambas que nascem hoje as maiores debilidades de cada uma.

Será talvez necessário repensar a história do último meio século como a história da progressiva dissociação entre ciência e política. Para ilustrar o abismo existente em nossos dias entre ambas, tomemos uma das reiteradas advertências de James Hansen (XIX): “A situação é que temos, na realidade, uma emergência, mas não estamos agindo como se tivéssemos entendido isso. Vamos ter que abandonar as emissões de carbono muito rapidamente. Isso é tecnicamente possível e faz sentido do ponto de vista econômico. Mas tal solução não está sendo perseguida e, de fato, não está sendo proposta por nenhum partido político”.

Essa advertência caracteriza à perfeição a situação política brasileira e mundial. De fato, a política permaneceu ancorada no embate ideológico entre as diversas formas (históricas ou imaginárias) de auto-organização da sociedade, ignorando que nossa civilização termo-fóssil está em vias de romper os equilíbrios ambientais imperantes no Holoceno, a época geológica cuja relativa estabilidade favoreceu toda a civilização. Continuar ignorando isso em nossa reflexão e prática políticas é ignorar que a história obedece, volente nolente, às leis da física e que essas, para relembrar a afirmação de Ban-ki-moon, não negociam com os seres humanos. Portanto, todo programa político, por mais progressista que se pretenda, será reacionário e irracional se não levar na devida conta os alertas lançados pela ciência sobre as crises ambientais contemporâneas.

Entendamos bem o quê na política tornou-se anacronicamente irracional. Tal como nos séculos passados, também em nossos dias a racionalidade política, le bon combat, continua sendo a luta pelo aprofundamento da democracia, pelas liberdades civis, pelo trabalho digno e bem remunerado, por um Estado capaz de assegurar educação, saúde, mobilidade e segurança, por equidade econômica, étnica e de gênero, pela laicidade, pela autonomia sobre o próprio corpo e pelo respeito aos direitos das outras espécies. Essa continuidade entre passado e presente é mais que nunca necessária, já que os últimos três ou quatro decênios vêm provocando, globalmente, retrocessos dramáticos em todas, ou quase todas, essas frentes de luta. Mas a política perde toda racionalidade e atualidade desde o momento em que ignora ou se recusa a agir em sintonia com o que se sabe sobre as leis bioquímicas e físicas que determinam o comportamento e os limites do sistema Terra, do qual as sociedades são parte e dependem existencialmente.

Se a política deve se repensar a partir da nova situação do planeta descrita pelas ciências da natureza, a situação histórica atual requer destas assumir responsabilidades políticas num nível sem precedentes. É fato que após Hiroshima, e mais ainda após 1968, os cientistas começaram a se sentir mais concernidos pelas implicações políticas de seu saber. Mas eles continuam ainda a excluir de seu job description toda dimensão político-prescritiva. Os grandes relatórios científicos, sejam eles do IPCC ou do IPBES, limitam-se a uma introdução destinada aos políticos, intitulada Summary for Policymakers. Essa postura de simples advertências e aconselhamentos é insuficiente. Como são insuficientes, ainda que importantíssimos, os sucessivos apelos e alertas dos cientistas à sociedade, como os de 1972, acima citados, seguidos pelos de 1992 e de 2017 (XX). A aceleração da degradação ambiental demonstra à saciedade essa insuficiência. É preciso que os cientistas tenham a audácia de reivindicar, doravante, um novo estatuto na sociedade, algo como um poder de veto em todas as decisões políticas que contrariem o consenso científico sobre os dossiês fundamentais das crises ambientais. O que pressupõe que a democracia entenda e institua a necessidade desse poder de veto. Essa nova simbiose entre ciência e política é o antídoto imprescindível para neutralizar os impactos nefastos da simbiose entre Estado e corporações.

Essa ideia foi esboçada num livro importante, intitulado Em direção a uma democracia ecológica. O cidadão, o cientista e o político (2010). Nele, Dominique Bourg e Kerry Whiteside enfrentam a tarefa de imaginar uma nova estrutura política capaz de conciliar democracia e esse novo poder da ciência (XXI). Essa nova estrutura supõe a superação de um governo representativo clássico, baseado na tradição liberal individualista, para a qual o indivíduo é a última instância do juízo sobre seus próprios interesses. Lembram os autores que:

“O sistema representativo clássico supõe que eu sou in fine o único juiz da minha condição. Quem pode, com efeito, melhor que eu julgar sobre meu bem- estar? Os representantes devem, portanto, retornar regularmente a seus eleitores para se assegurar do bem-fundado de suas políticas. Ora, a complexidade dos problemas ambientais, o fato de nos afetarem indiretamente ou de longe, impede-nos de apreciá-los por nós mesmos”.

De fato, porque as crises ambientais em que o mundo contemporâneo afunda não são apenas locais, mas transnacionais, porque são sistêmicas e cumulativas, e seus efeitos em cascata são, como afirma um comunicado de 5 de novembro de 2014 do IPCC, “severos, pervasivos e irreversíveis” (XXII), podendo produzir por retroalimentação positiva mudanças não lineares no sistema Terra susceptíveis de pôr em risco a própria sobrevivência das sociedades, os cidadãos não dispõem mais dos meios que lhes permitam ajuizar seus próprios interesses e, portanto, suas decisões políticas.

Assim como o capitalismo industrial significou a separação do trabalhador dos meios de produção, o capitalismo da era das grandes crises ambientais globais significa a separação do cidadão dos meios de seu próprio juízo político. Isso não implica a infantilização política do cidadão porque obviamente ninguém pode pretender tutelá-lo. Mas significa que os cidadãos globais que somos precisamos, doravante, convocar a ciência para entender onde está, de fato, o nosso próprio interesse político. As crises ambientais põem problemas para cuja resolução as instituições democráticas do passado não estão mais habilitadas, porque ciência e política, saber e interesse, eram ainda, no paradigma anterior, instâncias separadas. Elas não o são mais. De onde a necessidade da presença direta da ciência como instância inapelável de veto em todas as decisões econômicas e políticas estratégicas. Desde Hans Jonas, começamos a perceber que, hoje, o objeto central da ciência e da política é o mesmo. Não se trata mais para ambas de desejar a infinitude, mas de conseguir viabilizar nossa sobrevivência na finitude de nossa condição, o que pressupõe a convivência prudente e respeitosa com as demais formas de vida, nos limites cada vez menores desse “pequeno planeta”.

Todos os parâmetros do sistema Terra mensurados pela ciência mostram hoje, com crescente grau de confiabilidade, que as gerações nascidas nos anos 1960 e após deverão sofrer cruelmente as agruras de um mundo muito mais adverso para a vida do que o usufruído por nossos pais. Se o que estamos fazendo, politicamente, até agora resume o que somos capazes de fazer, essas gerações mais jovens serão lançadas – é a perspectiva mais provável – no abismo de um verdadeiro colapso ambiental. Sem uma nova aliança estratégica entre ciência e política que capacite as sociedades a saber para agir e a agir em sintonia com o que sabem, não resta muita esperança de que possamos evitar um futuro pior ou muito pior. A Universidade, “lugar natural” e possível de uma sinergia entre ciência e reflexão crítica, filosófica e sócio-política, só manterá sua relevância na atual situação histórica se entender e cumprir sua missão de fortalecer (e explicar à sociedade que a sustenta) a crucial importância estratégica dessa aliança.

Referências

[I] Cf. Edward Goldsmith, Peter Allen, “A Blueprint for survival”, The Ecologist, Londres, Janeiro de 1972.

[II] Cf. Climate Change 2007: Working Group I: The Physical Science Basis: “Abrupt climate changes, such as the collapse of the West Antarctic Ice Sheet, the rapid loss of the Greenland Ice Sheet or large-scale changes of ocean circulation systems, are not considered likely to occur in the 21st century, based on currently available model results. However, the occurrence of such changes becomes increasingly more likely as the perturbation of the climate system progresses”.

[III] Cf. L. Marques, “Ponto critico na Amazônia”. Jornal da Unicamp, 5/III/2018.

[IV] Cf. Thomas E. Lovejoy, Carlos Nobre, “Amazon Tipping Point” (Editorial). Science Advances, vol. 4, 2, 21/II/2018.

[V] Lijing Cheng et al., “Improved estimates of ocean heat content from 1960 to 2015”. Science Advances, 10/III/2017.

[VI] Cf. J. Stroeve et al., « Arctic sea ice decline: Faster than forecast ». Geophysical Research Letters, 34, 9, 2007: “All models participating in the IPCC AR4 show declining Arctic ice cover over this period. However, depending on the time window for analysis, none or very few individual model simulations show trends comparable to observations”.

[VII] Cf. Peter Wadham, A Farewell to ice. A Report from the Arctic. 2017. Londres, 2017. Para uma síntese do problema do degelo do Ártico e de suas consequências, cf. Claudio Angelo, A espiral da morte, São Paulo, 2017.

[VIII] Citada por Eli Kintish, “The great Greenland meltdown”. Science, 23/II/2017.

[IX] Cf. Megan Gannon, “Greenland’s biggest fire is a ‘warning’ for its future”. LiveScience, 13/IV/2018.

[X] Cf. M. A. Srokosz, & H.L. Bryden, “Observing the Atlantic Meridional Overturning Circulation yields a decade of inevitable surprises”. Science, 348, 19/VI/2015; James Hansen, “Ice melt, sea level rise and superstorms: evidence from paleoclimate data, climate modeling, and modern observations that 2 ◦C global warming could be dangerous”. Atmospheric Chemistry and Physics, 16, 2016, pp. 3761-3812.

[XI] David J.R. Thornalley et al., “Anomalously weak Labrador Sea convection and Atlantic overturning during the past 150 years”. Nature, 556, 11/IV/2018, pp. 227-230.

[XII] Citado por Anne Harrison, “Earth Summit makes political gains for environment”. UPI, 14/VI/1992: “We don’t have another 20 years to squander. We need to take the fast track out of Rio. (…) The main message of this conference is that you can’t deal with environment issues without dealing with the economic issues”. Veja-se também Tom Whipple, “There is no time to waste, they said 23 years ago”, The Times, 30/XI/2015.

[XIII] Citado pela Agência Reuters, em “Rio+20 summit begins under a cloud of criticism”, 20/VI/2012. Pressionado por Dilma Rousseff, Ban Ki-moon convocou em seguida apenas jornalistas brasileiros aos quais repetiu seis vezes, durante uma entrevista de 8 minutos, que a Conferência foi um “sucesso”. Cf. Denise Menchen, Fernando Rodrigues, “Pressionado, Secretário da ONU recua e elogia texto”. Folha de São Paulo, 22/VI/2012.

[XIV] Entrevista publicada em rede.

[XV] Citado por Adam Vaughan, “Global biodiversity targets won’t be met by 2020, scientists say”. The Guardian, 3/X/2014.

[XVI] Cf. Paris Agreement – Status of Ratification http://unfccc.int/paris_agreement/items/9444.php.

>[XVII]  Veja-se a respeito a ONG inglesa Global JusticeSão elas: 1. Walmart;  2. State Grid; 3. China National Petroleum; 4. Sinopec Group; 5. Shell ; 6.  Exxon ; 7. Volkswagen; 8. Toyota; 9. Apple; 10. BP; 11. Berkshire Hathaway; 12. McKesson; 13. Samsung; 14. Glencore; 15. Ind. & Com. Bank of China; 16. Daimler; 17. UnitedHealth Group; 18. CVS Health; 19. General Motors e 20. Ford Motors.

[XVIII]  Cf. Sheldon Wolin, Democracy Incorporated. Managed Democracy and the Specter of the Inverted Totalitarianism. Princeton University Press, 2008.

[XIX] Cf. James Hansen, CNA Conference + Trade Show, 12/III/2015.

[XX] Veja-se “Advertência dos Cientistas do Mundo à Humanidade”, documento patrocinado em 1992 pela Union of Concerned Scientists do MIT, e World Scientists’ Warning to Humanity: A Second Notice, que retoma e atualiza em 2017 o apelo de 1992. Cf. L. Marques, “Por uma Universidade implicada na agenda de nosso tempo”. Jornal da Unicamp, 14/VIII/2017.

[XXI] Cf. Dominique Bourg  & Kerry Whiteside, Vers une démocratie écologique. Le citoyen, le savant et le politique, Paris, Seuil, 2010.

[XXII] Cf. IPCC 5/XI/2014, Climate Change 2014. Synthesis Report.

Luiz Marques é professor livre-docente do Departamento de História do IFCH /Unicamp. Pela editora da Unicamp, publicou Giorgio Vasari, Vida de Michelangelo (1568), 2011 e Capitalismo e Colapso ambiental, 2015, 2a edição, 2016. Coordena a coleção Palavra da Arte, dedicada às fontes da historiografia artística, e participa com outros colegas do coletivo Crisálida, Crises Socioambientais Labor Interdisciplinar Debate & Atualização (crisalida.eco.br) – Publicado originalmente no Jornal da Unicamp.

Atlas do envenenamento alimentar no Brasil

Luiz Marques

No âmbito da expansão global do capitalismo comercial e industrial desde o século XVI, três aspectos indissociáveis conferem ao Brasil posições de indisputada proeminência. Somos o país que, durante quase quatro séculos, mais indivíduos escravizou em toda a história da escravidão humana. A destruição e degradação conjuntas das coberturas vegetais do país constituem, em rapidez e em escala, a mais fulminante destruição da biosfera cometida por uma nação ou império em toda a história da espécie humana. Levamos mais de quatro séculos para remover cerca de 1,2 milhão de km2 dos 1,3 milhão de km2 que compunham originariamente a Mata Atlântica (a destruição ganhou escala apenas a partir do século XIX e ainda continua) (1). Mas apenas nos últimos 50 anos mais de 3,3 milhões de km2 de cobertura vegetal nativa foram suprimidos ou degradados na Amazônia, no Cerrado e na Caatinga (2), sendo que mais quase 1 milhão de km2 podem ser legalmentedesmatados em todo o Brasil segundo o antigo e o novo Código Florestal (3).

O terceiro aspecto, enfim, diz respeito ao uso de agrotóxicos. “O Brasil é o campeão mundial no uso de produtos químicos na agricultura”, afirma José Roberto Postali Parra, ex-diretor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) (4). Nos últimos dez anos, de fato, o Brasil arrebatou dos EUA a posição de maior consumidor mundial de pesticidas (5).

Como bem diz seu nome, um pesticida industrial é um composto químico que visa atacar uma “peste”, termo que designa no jargão produtivista toda espécie que compita com a humana pelos mesmos alimentos ou tenha algum potencial de ameaça à produtividade ou saúde humana ou de espécies que servem de alimentação aos homens. O termo pesticida abrange herbicidas, inseticidas e fungicidas, aplicados os dois últimos em plantas e em animais. Pesticidas são usados também contra pássaros (corbicidas, por exemplo), vermes (nematicidas), mamíferos roedores (rodenticidas), microorganismos, etc. Para entender como e por que o Brasil galgou essa posição de maior consumidor desses compostos, dispomos agora de uma referência fundamental. Trata-se de Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia, de Larissa Mies Bombardi, do Departamento de Geografia da FFLCH/USP (6).  Coroando intervenções já dedicadas pela estudiosa ao problema desde 2011 (7), esse trabalho de maior fôlego eleva nosso conhecimento a outro patamar, inclusive por comparar sistematicamente o uso dos pesticidas e as legislações vigentes a esse respeito no Brasil e na União Europeia. Ele culmina num Atlas do uso de agrotóxicos no país, por estado, cultura agrícola e tipo de pesticida, além de uma distribuição geográfica, etária e étnica de suas principais vítimas diretas. Sobretudo, as análises de Bombardi lançam luz sobre os nexos entre o uso crescente de agrotóxicos no país e a liderança nacional, política e econômica, do agronegócio, em fina sintonia com as megacorporações agroquímicas oligopolizadas que controlam toda a cadeia alimentar: das sementes, agrotóxicos, fertilizantes e demais insumos à distribuição e negociação nos mercados futuros das commodities agrícolas. Após as fusões ou absorções ocorridas nos últimos anos, quase 95% desse mercado global é agora comandado por cinco megacorporações agroquímicas, sendo que apenas três delas controlam 72,6% dele, como mostra a Figura 1.

Figura 1 – As fusões e incorporações da Bayer/Monsanto, ChemChina/Syngenta e Dow/DuPont criam um controle quase total por apenas cinco megacorporações de todo o ciclo agroquímico | Fonte: Bloomberg, citado por Dani Bancroft, “Bayer offers Big Buy out for the infamous Monsanto”.  23/V/2016

Concentração fundiária e agronegócio

Talvez nenhum outro aspecto expresse com tanta crueza a desigualdade da sociedade brasileira quanto a concentração da propriedade fundiária. Embora os governos do PT exibam alguns resultados sociais muito positivos quando comparados a governos de outras siglas (8), no item propriedade fundiária seu pacto com o agronegócio apenas aprofundou o abismo histórico da desigualdade no país. Os governos do PT não apenas perpetuaram a tolerância à grilagem e à concentração da propriedade fundiária, mas acrescentaram a esse quadro de apropriação violenta da terra a participação direta do Estado no agronegócio e a quase inexistente carga tributária incidente sobre os imóveis rurais. Em 2015, apenas 0,1% de todos os recursos arrecadados pela Receita Federal veio do Imposto Territorial Rural (9). Assim, o traço mais saliente das mudanças na estrutura da propriedade fundiária na história recente do Brasil foi sua rápida e extrema concentração entre 2003 e 2014, como mostra a Figura 2.

Fig. 2 – Evolução da estrutura fundiária no Brasil entre 2003 e 2014. | Fonte: Incra, citado por Larissa Mies Bombardi, Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. FFLCH – USP, Novembro, 2017, Tabela 1, p. 30

Em 2003, as 983 propriedades com mais de 10 mil hectares somavam 7% da área dos imóveis rurais no país. Em 2014, elas passaram a ser 3.057 e acumulavam 28% dessa área. Nesse universo do latifúndio, destaca-se a multiplicação dos megalatifúndios com mais de 100 mil hectares. Em 2003, eles eram apenas 22 e representavam 2% da área dos imóveis rurais do país. Em 2014, eles passaram a ser 365 e ocupavam 19% dessa área. No outro extremo da balança, as pequenas propriedades de até 10 hectares, que ocupavam 2% dessa área em 2003, representavam em 2014 apenas 1%.

Esse processo de concentração fundiária foi uma condição de possibilidade da consolidação de um novo modelo de economia rural, o agronegócio, adequado à globalização e à conversão dos alimentos agrícolas em soft commodities (soja, milho, café, cacau, gado etc), cujo valor é negociado na CME (Chicago Mercantile Exchange) e cuja destinação é, sobretudo, a China e, em segundo lugar, a Europa e os EUA. Como bem mostra Bombardi, o crescimento do agronegócio brasileiro apoia-se mais na expansão da área cultivada, frequentemente em detrimento das florestas, que em ganhos de produtividade e no manejo sustentável do solo e no respeito à biodiversidade, como mostra a Figura 3, que compara área, produto e produtividade (kg/ha) no cultivo da soja.

Fig. 3 – Comparação entre área (mil ha), produtividade (Kg/ha) e produto (em mil toneladas) da soja entre as safras de 2002/2003 e de 2015/2016 | Fonte: Companhia Nacional de Abastecimento, 2016, citado por por Larissa Mies Bombardi, Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. FFLCH – USP, Novembro, 2017, Gráfico 2, p. 25.

Como se vê, a área de cultivo da soja aumentou de 18,5 milhões de hectares em 2002/2003 para 33 milhões em 2015/2016, um salto de 79% em 13 anos para um aumento equivalente de 84% da produção de soja no mesmo período, com incremento quase irrelevante da produtividade. Para o agronegócio é mais barato avançar sobre a floresta, processo que pode inclusive gerar lucro pela venda da madeira, que investir numa cultura de longo prazo. Seu lema é considerar a devastação ambiental como uma externalidade e aniquilar tudo o que ameace a máxima rentabilização imediata de sua mercadoria.

“A monocultura causa desequilíbrios”

Além de desmatamento, esse modelo monocultor e destrutivo de agricultura “causa desequilíbrios”, como reitera José Roberto Postali Parra, da Esalq/USP (10). Para o agronegócio, esses desequilíbrios têm uma solução simples: a supressão ou tentativa de supressão das espécies animais e vegetais (as espécies insensatamente chamadas “daninhas”) por meio do uso intensivo de agrotóxicos. Detentora dos prêmios Miss Desmatamento e Motosserra de Ouro, além de presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e Ministra da Agricultura durante o governo de Dilma Rousseff, Kátia Abreu definiu com rara felicidade o ideal da classe que ela representa: “Quanto mais defensivos melhor, porque a tendência é os preços caírem em função do aumento da oferta” (11). A Figura 4, abaixo, mostra os saltos sucessivos no uso de agrotóxicos a partir de 2006, de resto a taxas muito superiores às do aumento da área cultivada e do produto. Observe-se que entre 2002 e 2014, o consumo de agrotóxicos, medido por peso do ingrediente ativo, aumentou cerca de 340%, de cerca de 150 mil toneladas para mais de 500 mil toneladas de ingrediente ativo, uma taxa muito maior que os 84% de aumento do produto entre 2002/2003 e 2015/2016, no caso acima ilustrado da soja (de 52 para 97 milhões de toneladas nesse período).

Fig. 4 – Consumo de agrotóxicos no Brasil em toneladas do ingrediente ativo, 2000 –  2014 | Fonte: Ibama, citado por Larissa Mies Bombardi, Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. FFLCH – USP, Novembro, 2017, Gráfico 10, p. 33

 

O Brasil participa com apenas 4% do comércio mundial do agronegócio (12), mas consome hoje cerca de 20% de todo agrotóxico comercializado no mundo todo. Mais importantes, entretanto, que esse desbalanço são:

(1) a nocividade, constatada ou potencial, para a saúde humana e para o meio ambiente dos ingredientes ativos utilizados;

(2) o uso de ingredientes proibidos no exterior;

(3) o Limite Máximo de Resíduos (LMR) permitido pela legislação brasileira para cada um desses ingredientes nas amostras de alimentos e de água. Como se verá abaixo, esses limites são muito superiores aos permitidos pela legislação europeia, a qual é, de resto, frequentemente acusada de ceder às pressões das megacorporações da agroquímica;

(4) o uso corrente de ingredientes proibidos no Brasil;

(5) as doses excessivas utilizadas;

(6) os resíduos desses compostos encontrados pela Anvisa nos alimentos, que, via de regra, excedem os limites estabelecidos pela legislação brasileira.

Exemplos dos problemas aqui elencados nos itens 4 a 6 abundam na imprensa e nos estudos científicos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) “aponta que quase 30% dos principais alimentos da cesta brasileira apresentaram irregularidades no uso de defensivos agrícolas” (13). No ano passado, a revista Examenoticiou que a Anvisa “encontrou níveis elevados de resíduos agrotóxicos em um terço das frutas, vegetais e hortaliças analisadas entre 2011 e 2012. Pior, um a cada três exemplares avaliados apresenta ingredientes ativos não autorizados, entre eles dois agrotóxicos que nunca foram registrados no Brasil: o azaconazol e o tebufempirade (14) ”. Segundo a já citada reportagem da CBN, “em São Paulo, por exemplo, desde 2002, nenhuma multa por irregularidades foi aplicada, nem mesmo em casos de repetidas reincidências”. Baseando-se em pesquisas de Karen Friedrich, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Marina Rossi afirma: “Segundo o Dossiê Abrasco (…), 70% dos alimentos in natura consumidos no país estão contaminados por agrotóxicos. Desses, segundo a Anvisa, 28% contêm substâncias não autorizadas. Isso sem contar os alimentos processados, que são feitos a partir de grãos geneticamente modificados e cheios dessas substâncias químicas (…). Mais da metade dos agrotóxicos usados no Brasil hoje são banidos em países da União Europeia e nos Estados Unidos” (15).

Sobre a nocividade dos ingredientes utilizados, muitos deles já proibidos no exterior, e sobre as brutais discrepâncias entre as legislações europeia e brasileira no tocante ao Limite Máximo de Resíduos (LMR) permitido de cada um desses ingredientes nas amostras de alimentos e de água (os itens 1 a 3, acima), os dados são igualmente estarrecedores. Em 6 de abril de 2015, o Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), órgão do Ministério da Saúde, divulgou um documento em que afirma: “Dentre os efeitos associados à exposição crônica a ingredientes ativos de agrotóxicos podem ser citados infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer. (…) Vale ressaltar que a presença de resíduos de agrotóxicos não ocorre apenas em alimentos in natura, mas também em muitos produtos alimentícios processados pela indústria, como biscoitos, salgadinhos, pães, cereais matinais, lasanhas, pizzas e outros que têm como ingredientes o trigo, o milho e a soja, por exemplo. Ainda podem estar presentes nas carnes e leites de animais que se alimentam de ração com traços de agrotóxicos, devido ao processo de bioacumulação” (16).

O aumento da variedade dos ingredientes ativos impulsionado pelas pesquisas agroquímicas é impressionante. Segundo a Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA), havia em 2007 “mais de 1055 ingredientes ativos registrados como pesticidas, formulados em milhares de produtos disponíveis no mercado” (17). A Figura 5, abaixo, elenca os 10 ingredientes ativos mais utilizados na agricultura brasileira.

Fig. 5 – Os 10 ingredientes ativos mais vendidos no Brasil em 2014, em ordem decrescente | Fonte: Ibama, citado por Larissa Mies Bombardi, Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. FFLCH – USP, Novembro, 2017, Gráfico 10, p. 35

Perturbadores endócrinos, carcinogênicos, mutagênicos, teratogênicos

Por motivos de espaço, reportamos abaixo a toxicidade de apenas cinco desses compostos para os humanos, não humanos e para o meio ambiente, bem como o Limite Máximo de Resíduos (LMR) permitido no produto e na água segundo a legislação europeia e a brasileira (18):

1º – Glifosato (glicina + fosfato). As sementes geneticamente modificadas, chamadas Roundup Ready (RR), da Monsanto, são capazes de resistir ao herbicida Roundup, o mais vendido no Brasil e no mundo, produzido à base de glifosato. Trata-se de um herbicida sistêmico, isto é, desenhado para matar quaisquer plantas, exceto as geneticamente modificadas para resistir a ele. Seu uso tem sido associado a maior incidência de câncer, à redução da progesterona em células de mamíferos, a abortos e a alterações teratogênicas por via placentária. Em 15 de março de 2015, o Centro Internacional de Pesquisas sobre o Câncer (IARC) considerou que havia “evidência suficiente” de que o composto causava câncer em animais e “evidência limitada” de que o causava em humanos, classificando assim o glifosato no Grupo 2A, isto é, como cancerígeno “provável no homem” (ao lado de quatro outros pesticidas) (19). O Limite Máximo de Resíduos (LMR) de glifosato permitido na soja na UE é de 0,05 mg/kg, no Brasil é de 10 mg/kg, portanto um limite 200 vezes maior.

2º – 2,4-D (ácido diclorofenóxiacético). Mais de 1.500 herbicidas contêm esse ingrediente ativo. A OMS coloca-o no grupo II, isto é, “moderadamente tóxico” (moderately hazardous) e o IARC afirma: “o herbicida 2,4-D foi classificado como possivelmente carcinogênico para humanos (Grupo 2B). (…) Há forte evidência de que 2,4-D induz estresse oxidativo, um mecanismo que pode ocorrer em humanos, e evidência moderada de que 2,4-D causa imunossupressão, a partir de estudos in vivo in vitro” (20). Para o National Resource Defense Council (NRDC), há provas conclusivas de que o 2,4-D é um perturbador endócrino, isto é, um composto que interfere no funcionamento normal do sistema hormonal dos organismos: “Estudos em laboratório sugerem que o 2,4-D pode impedir a ação normal de hormônios estrógenos, andrógenos e, mais conclusivamente, da tireoide (21). Dezenas de estudos epidemiológicos, animais e de laboratório mostraram uma associação entre 2,4-D (22) e perturbações da tireoide”. Luiz Leonardo Foloni (FEAGRI/Unicamp) assegura numa entrevista a irrestrita aceitação internacional do 2,4-D. Na realidade, esse composto foi banido no estado de Ontário, no Canadá, em 2009, na Austrália em 2013 e no Vietnã em 2017 (23). E há reiteradas demandas de proibição do 2,4-D nos EUA, não atendidas pelas autoridades desse país (24). O Limite Máximo de Resíduos (LMR) de 2,4-D permitido na água potável na UE é de 0,1 μg (micrograma = 1/1000 miligrama), no Brasil é de 30 μg, portanto um limite 300 vezes maior.

3º – Acefato. Pertencente à classe dos organofosforados, o acefato é o inseticida mais usado no Brasil (25). A OMS coloca-o no grupo II, isto é, “moderadamente tóxico” (moderately hazardous). O Limite Máximo de Resíduos (LMR) de acefato permitido na água potável na UE é de 0,1 μg (micrograma = 1/1000 miligrama); no Brasil, ele não tem limite estabelecido.

5º – Clorpirifós. Inseticida da classe dos organofosforados, que altera o funcionamento de neurotransmissores (acetilcolina) no sistema nervoso central. Em 2009, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o clorpirifós como “moderadamente tóxico” (II – Moderately hazardous). Mas em 2012, esse produto foi associado a potenciais riscos ao desenvolvimento neurológico e o editorial da revista Environmental Health Perspectives, de 25 de abril de 2012, intitulado “A Research Strategy to Discover the Environmental Causes of Autism and Neurodevelopmental Disabilities” (26), afirma que: “Estudos prospectivos (…) associaram comportamentos autistas a exposições pré-natais a inseticidas organofosforados clorpirifós”. Já em 2001, seu uso doméstico fora banido dos EUA e ao final da administração Obama, a Agência de Proteção Ambiental desse país (EPA) recomendou seu banimento total, recomendação anulada por Donald Trump, beneficiário durante a campanha eleitoral de doações da Dow Chemical, produtora desse composto (27). Na União Europeia (UE), a avaliação da toxicidade do cloropirifós está em curso de revisão. O Limite Máximo de Resíduos (LMR) de clorpirifós permitido na água potável na UE é de 0,1 μg (micrograma = 1/1000 miligrama), no Brasil é de 30 μg, portanto um limite 300 vezes maior.

7º – Atrazina. Produzido pela Syngenta, a atrazina é um herbicida que afeta a fotossíntese e atua em sinergia com outros herbicidas. Tyrone B. Hayes, da Universidade de Berkeley, e colegas mostraram que esse composto pode mudar o sexo da rã-de-unha africana (Xenopus laevis) e que “a atrazina e outros pesticidas perturbadores endócrinos são prováveis fatores em ação nos declínios globais dos anfíbios” (28). Em 2015, Andrea Vogel e colegas mostraram que a atrazina é um perturbador endócrino em invertebrados (29). A Itália e a Alemanha baniram a atrazina em 1991, e em 2004 a atrazina foi proibida em toda a UE (3). O Limite Máximo de Resíduos (LMR) de atrazina permitido na água potável na UE é de 0,1 μg (micrograma = 1/1000 miligrama), no Brasil é de 2 μg, portanto um limite 20 vezes maior.

A guerra química insensata e de antemão perdida contra a natureza

Há pelo menos 55 anos, desde o célebre livro de Rachel Carson, Primavera Silenciosa (1962), sabemos que os pesticidas industriais lançaram a espécie humana numa guerra biocida, suicida e de antemão perdida. A ideia mesma de um pesticida sintético usado sistematicamente contra outras espécies no fito de aniquilá-las dá prova cabal da insanidade da agricultura industrial: envenenam-se nossos alimentos para matar outras espécies ou impedi-las de comê-los. As doses do veneno, pequenas em relação à massa corpórea humana, não nos matam. Mas, ao atirarem numa espécie com uma metralhadora giratória, os pesticidas provocam “danos colaterais”: matam ou debilitam espécies não visadas, provocando desequilíbrios sistêmicos que promovem seleções artificiais capazes de reforçar a tolerância das espécies visadas, ou a invasão de espécies oportunistas, por vezes tão ou mais ameaçadoras para as plantações e para os homens que as espécies visadas pelos pesticidas. Além disso, a médio e longo prazo os pesticidas intoxicam e adoecem o próprio homem, tanto mais porque somos obrigados a aumentar as doses dos pesticidas e a combiná-los com outros em coquetéis cada vez mais tóxicos, à medida que as espécies visadas se tornam tolerantes à dose ou ao princípio ativo anterior. Uma suma de pesquisas científicas (31) mostra o caráter contraproducente dos agrotóxicos, seja do ponto de vista de seus efeitos sobre outras espécies – por exemplo, as abelhas e demais polinizadores –, seja do ponto de vista da saúde humana e de outras espécies não visadas, seja ainda da própria produtividade agrícola. Citemos apenas três desses estudos. Um documento da FAO de 2003 mostra que o uso crescente de pesticidas desde os anos 1960 não aumenta, mas, ao contrário, diminui relativamente as colheitas, sendo que as perdas de safra por causa de pestes eram em 1998 já da ordem de 25% a 50%, dependendo da cultura. O documento assim comenta esse fato: “É perturbador que ao longo dos últimos três ou quatro decênios, as perdas de colheitas em todas as maiores culturas aumentaram em termos relativos. (…) É interessante notar que o aumento das perdas de colheitas é acompanhado por um crescimento na taxa de uso de pesticidas” (32). Em 2013, um artigo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences refere-se ao morticínio de diversas espécies causado por pesticidas, mesmo utilizados em concentrações consideradas seguras pela legislação europeia: “Pesticidas causam efeitos estatisticamente significantes em espécies em ambas as regiões [Europa e Austrália], com perdas de até 42% nas populações taxonômicas registradas. Além disso, os efeitos na Europa foram detectados em concentrações que a atual legislação considera ambientalmente protetiva. Portanto, a atual avaliação de risco ecológico de pesticidas falha em proteger a biodiversidade, tornando necessárias novas abordagens envolvendo ecologia e ecotoxicologia” (33). Enfim, em 2014, um grupo internacional de trabalho de quatro anos sobre os pesticidas sistêmicos, o Task Force on Systemic Pesticides (TFSP), reunindo 29 pesquisadores, declara em seus resultados que os pesticidas sistêmicos (os neonicotinoides, por exemplo) constituem uma inequívoca e crescente ameaça tanto à agricultura quanto aos ecossistemas. Jean-Marc Bonmatin, um pesquisador do CNRS francês, pertencente a esse grupo de trabalho, assim resumiu esses resultados: “A evidência é clara. Estamos testemunhando uma ameaça à produtividade de nosso ambiente natural e agrícola, uma ameaça equivalente à dos organofosfatados ou DDT [denunciados em 1962 por Rachel Carson]. Longe de proteger a produção de alimentos, o uso de inseticidas neonicotinoides está ameaçando a própria infraestrutura que permite essa produção” (34).

Pesticidas, o outro lado da moeda das armas químicas de destruição em massa

Entre os pesticidas industriais e as guerras químicas há uma íntima interação, passada e presente. Ambos impõem-se como um fato absolutamente novo na história da destruição do meio ambiente pelo homem e de sua autointoxicação. Os inseticidas organoclorados e organofosforados, e os herbicidas baseados em hormônios sintéticos nascem nos anos 1920-1940 como resultado das pesquisas sobre armas químicas usadas durante a I Grande Guerra pelos dois campos beligerantes. Essa interação continua no período entre-guerras, em especial na Alemanha, então em busca de recuperar sua supremacia na indústria química. Em seu quadro de cientistas, a Degesh (Deutsche Gesellschaft für Schädlingsbekämpfung – Sociedade Alemã para o Controle de Pragas), criada em 1919, contava químicos como Fritz Haber (Prêmio Nobel) e Ferdinand Flury, que desenvolveu em 1920 o Zyklon A, um pesticida à base de cianureto, precedente imediato de outro inseticida, o Zyklon B, patenteado em 1926 por Walter Heerdt eusado sucessivamente nas câmaras de gás dos campos de extermínio de Auschwitz-Birkenau e Majdanek. Outro exemplo é o da IG Farben, de cujo desmembramento após 1945 resultou a Agfa, a BASF, a Hoechst e a Bayer. Para esse conglomerado industrial alemão, trabalhavam químicos como Gerhard Schrader (1903-1990), funcionário da Bayer e responsável pela descoberta e viabilização industrial dos compostos de organofosforados que agem sobre o sistema nervoso central. De tais compostos derivam pesticidas como o bladan e o parathion (E 605) e armas químicas como o Tabun (1936), o Sarin (1938), o Soman (1944) e o Cyclosarin (1949), as três primeiras desenvolvidas, ainda que não usadas, pelo exército alemão na II Grande Guerra. Após a guerra, Schrader foi por dois anos mantido prisioneiro dos Aliados, que o obrigaram a comunicar-lhes os resultados de suas pesquisas sobre ésteres de fosfato orgânicos, em seguida desenvolvidos na fabricação de novos pesticidas.

Essa interação entre pesticidas e armas químicas, hoje melhor denominadas químico-genéticas, continua em nossos dias. O Defense Advanced Research Projects Agency (Darpa), do Pentágono, está investindo US$ 100 milhões em projetos, potencialmente catastróficos, de “extinção genética” de espécies consideradas nocivas ao homem, sem esconder, contudo, seu interesse em possíveis desdobramentos militares dessas pesquisas (35). Um especialista da Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD) da ONU declarou ao The Guardian: “Pode-se ser capaz de erradicar um vírus ou a inteira população de um mosquito, mas isso pode ter efeitos ecológicos em cascata”. O potencial militar das pesquisas em edição genética (o chamado “gene drive”) manifesta-se já no fato de que seu principal patrocinador é o Pentágono. Entre 2008 e 2014, o governo dos EUA investiu US$ 820 milhões em biologia sintética, sendo que desde 2012 a maior parte desse investimento veio do Darpa e de outras agências militares. Referindo-se ao risco de que armas baseadas em tecnologias químico-genéticas sejam usadas por “hostile or rogue actors”, um porta-voz do Darpa afirmou que essas pesquisas são de “crítica importância para permitir ao Departamento de Defesa defender seu pessoal e preservar sua prontidão militar. (….) É de responsabilidade do Darpa desenvolver tais pesquisas e tecnologias que podem proteger contra seu mau-uso, acidental ou intencional”. É preciso uma boa dose de amnésia para não perceber nessa interação “defensiva” entre o Pentágono e a pesquisa químico-genética de aniquilação biológica um revival das interações entre “defensivos agrícolas” e a guerra química e de extermínio humano, durante e após a I Grande Guerra (36).

Referências
[1] Segundo o Instituto Brasileiro de Florestas, a área original da Mata Atlântica era originalmente 1.315.460 km², 15% do território brasileiro. Atualmente o remanescente é 102.012 km², 7,91% da área original. Entre 1985 e 2013, a Mata Atlântica perdeu mais 18.509 km2. “A cada 2 dias, um Ibirapuera de Mata Atlântica desaparece”. Cf. SOS Mata Atlântica. “Divulgados novos dados sobre o desmatamento da Mata Atlântica”, 27/V/2014.

[2] Na Amazônia brasileira, a área de corte raso da floresta (1970-2017) chega a 790 mil km2, sendo 421.775 km2 de corte raso no acumulado de 1988-2016 (INPE). Mas “a área de corte raso e a de degradação representam juntas cerca de dois milhões de km2, ou seja 40% da floresta amazônica brasileira” (dados de 2013). Cf. A. D. Nobre, “Il faut un effort de guerre pour reboiser l’Amazonie”. Le Monde, 24/XI/2014. No Cerrado, um bioma de cerca de 2 milhões de km2, a devastação em 35 anos [1980-2015] foi da ordem de 1 milhão de km2. “Entre 2002 e 2011, as taxas de desmatamento nesse bioma (1% ao ano) foram 2,5 vezes maior que na Amazônia. (…) Mantidas as tendências atuais, 31% a 34% da área restante da cobertura vegetal do Cerrado deve ser suprimida até 2050 (…), levando à extinção ~480 espécies de plantas endêmicas – três vezes mais que todas as extinções documentadas desde 1500”. Cf. Bernardo B.N. Strassburg et al., “Moment of truth for the Cerrado hotspot”. Nature Ecology & Evolution, 23/III/2017. Segundo o INPE, a Caatinga já perdeu cerca de 45% dos 734.478 km² originais de sua vegetação natural.

[3] Mais precisamente, 957 mil km2, segundo Gerd Sparovek (Esalq/USP), Observatório do Código Florestal . Para Britaldo Soares Filho e colegas, “tanto o antigo quanto o novo Código Florestal permitem um desmatamento legal de ainda mais 88 (+/-6) milhões de hectares [880 mil km2] em propriedades privadas. Essa área de vegetação nativa, ao abrigo das exigências de Reserva Legal e Entornos de Cursos de Água, constituem um ‘excedente ambiental’ (“environmental surplus) com potencial de emissão de 18 Gt de CO2-eq”. Cf. Britaldo Soares-Filho et al.“Cracking Brazil’s Forest Code”. Science, 344, 6182, 25/IV2014, pp. 363-364.

[4] Entrevista concedida a Marcos Pivetta e Marcos de Oliveira, “Agricultor de insetos”. Pesquisa Fapesp, 18, 261, novembro de 2017, pp. 32-37.

[5] Cf. Michelle Moreira, “Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo”. Agência Brasil, 3/XII/2015; Flávia Milhorance, “Brasil lidera o ranking de consumo de agrotóxicos”. O Globo, 8/IV/2015.

[6] Cf. Larissa Mies Bombardi, Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia, Laboratório de Geografia Agrária, FFLCH/USP, Novembro, 2017, 296 p.

[7] Para a bibliografia anterior de Bombardi, veja-se <https://www.larissabombardi.blog.br/blog-geo>, em particular, “Intoxicação e morte por agrotóxicos no Brasil: a nova versão do capitalismo oligopolizado”. Boletim Dataluta, setembro de 2011 (em rede).

[8] Veja-se Sérgio Lírio, “O abismo não é intransponível”. Carta Capital, 29/XI/2017, pp. 26-28.

[9] Cf. Pedro Durán, “Desde 2009, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo”. CBN, 3/V/2016.

[10] Pivetta & Oliveira, “Agricultor de insetos” (cit): “a monocultura causa desequilíbrios”.

[11] “Kátia Abreu quer liberação mais rápida de agrotóxicos pela ANVISA”. Viomundo, 19/X/2011.

[12] Cf. Dante D. G. Scolari, “Produção agrícola mundial: o potencial do Brasil”. Embrapa, 2007.

[13] Cf. Michelle Moreira, “Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo”. Agência Brasil, 3/XII/2015.

[14] Cf. Vanessa Barbosa, “Anvisa aponta 13 alimentos que pecam no uso de agrotóxicos”. Exame, 13/IX/2016.

[15] Cf. Marina Rossi, “O ‘alarmante’ uso de agrotóxicos no Basil atinge 70% dos alimentos”. El País, edição em português, 30/IV/2015.

[16] Veja-se “Posicionamento do Insituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva acerca dos Agrotóxicos”. 

[17] Cf. EPA, “Assessing Health Risks from Pesticides” (em rede).

[18] Os dados comparativos sobre os LMR no Brasil e na União Europeia (UE) são retirados do já citado trabalho de Bombardi.

[19] Cf. Daniel Cressey, « Widely used herbicide linked to cancer ». Nature, 24/III/2015: “Two of the pesticides — tetrachlorvinphos and parathion — were rated as “possibly carcinogenic to humans”, or category 2B. Three — malathion, diazinon and glyphosate — were rated as “probably carcinogenic to humans”, labelled category 2A”.

[20] Cf. IARC Monographs evaluate DDT, lindane, and 2,4-D. Press release n. 236, 23/VI/2015. Veja-se também OMS.

[21] Cf. Danielle Sedbrook, “2,4-D: The Most Dangerous Pesticide You’ve Never Heard Of”. NRDC, 15/III/2016.

[22] Veja-se sua entrevista | L. L. Foloni, O Herbicida 2,4-D: Uma Visão Geral, 2016.

[23] Cf. “APVMA [Australian Pesticides and Veterinary Medicines Authority]: Australia Bans Toxic Herbicide 2,4-D Products”. Sustainable Pulse, 24/VIII/2013; “Govt bans 2,4-D, paraquat in Vietnam”. Vietnamnet, 16/II/2017.

[24] Veja-se, por exemplo, Andrew Pollack, “E.P.A. Denies an Environmental Group’s Request to Ban a Widely Used Weed Killer”. The New York Times, 9/IV/2012.

[25] Cf. Idiana Tomazelli & Mariana Sallowicz, “Uso de agrotóxicos no País mais que dobra entre 2000 e 2012”. O Estado de São Paulo,19/VI/2015. “O agrotóxico mais empregado foi o glifosato, um herbicida apontado por pesquisadores como nocivo à saúde. Entre os inseticidas, o mais usado foi o acefato”.

[26] Cf. Philip J. Landrigan, Luca Lambertini, Linda S. Birnbaum, “A Research Strategy to Discover the Environmental Causes of Autism and Neurodevelopmental Disabilities” (Editorial). Environmental Health Perspectives, 25/IV/2012..

[27] Cf. “Don’t let feds make pesticide call”, Daily Record (USA Today), Editorial, 27/XI/2017.

[28] Cf. Tyrone B. Hayes et al., “Atrazine induces complete feminization and chemical castration in male African clawed frogs (Xenopus laevis)”. Proceedings of the National Academy of Sciences, 107, 10, 9/III/2010, pp. 4612-4617: “The present findings exemplify the role that atrazine and other endocrine-disrupting pesticides likely play in global amphibian declines”.

[29] Cf. Andrea Vogel et al., “Effects of atrazine exposure on male reproductive performance in Drosophila melangaster”. Journal of Insect Physiology, 72, janeiro, 2015, pp. 14-21.

[30] Cf. Franck Akerman, “The Economics of Atrazine”, International Journal of Occupational and Environmental Health, 13, 4, outubro-dezembro de 2007, pp. 441-449.

[31] Veja-se, por exemplo, Jan Dich et al., “Pesticides and Cancer”. Cancer, causes & control, maio, 1997, 8, 3, pp. 420-443. IDEM, “Pesticide and prostate cancer. Again”. Pesticide Action Network, 23/I/2013.(1997, 8, pp. 420-443); Idem (23/I/2013).

[32] Report of the First External Review of the Systemwide Programme on Integrated Pest Management (SP-IPM). Interim Science Council Secretariat – FAO, agosto de 2003.

[33] Cf. Mikhail A. Beketov et al., “Pesticides reduce regional biodiversity of stream invertebrates”. PNAS, online, 17/VI/2013.Também Sharon Oosthoek, “Pesticides spark broad biodiversity loss”. Nature, 17/VI/2013.

[34] Citado por Damian Carrington, “Insecticides put world food supplies at risk, say scientists”. TG, 24/VI/2014.

[35] Cf. Arthur Neslen, “Us military agency invests $ 100m in genetic extinction technologies”. The Guardian, 4/XII/2017.

[36] No período entreguerras, armas químicas continuaram a ser utilizadas pela aviação inglesa, por exemplo, em 1919 contra os bolcheviques e em 1925 contra a cidade de Sulaimaniya, capital do Kurdistão iraquiano; a aviação italiana utilizou-as em 1935 e 1936 em sua tentativa de exterminar a população da Etiópia, e o exército bolchevique, segundo uma documentação aparentemente confiável, dizimou com armas químicas os revoltosos de Tambov, uma das 118 revoltas camponesas contra o exército vermelho reportadas pela Cheka, em fevereiro de 1921. Cf. Eric Croddy, Clarisa Perez-Armendaruz & John Hart, Chemical and Biological Warfare. A comprehensive survey for the concerned citizen. Nova York, Springer-Verlag, 2002.

Luiz Marques é professor livre-docente do Departamento de História do IFCH /Unicamp. Pela editora da Unicamp, publicou Giorgio Vasari, Vida de Michelangelo (1568), 2011 e Capitalismo e Colapso ambiental, 2015, 2a edição, 2016. Coordena a coleção Palavra da Arte, dedicada às fontes da historiografia artística, e participa com outros colegas do coletivo Crisálida, Crises Socioambientais Labor Interdisciplinar Debate & Atualização (crisalida.eco.br) – Publicado originalmente no Jornal da Unicamp.

“Tostados, assados e grelhados”

Luiz Marques

​“Como disse antes, se não fizermos nada a respeito da mudança climática, seremos tostados, assados e grelhados num horizonte de tempo de 50 anos. (…) Se não encararmos essas duas questões – mudança climática e desigualdade crescente – avançaremos a partir de agora em direção a sombrios 50 anos” (I). Quem fala é Christine Lagarde, diretora do Fundo Monetário Internacional, durante um painel da Future Investment Initiative, ocorrido em 25 de outubro em Riad, na Arábia Saudita.

É positivo que o FMI funcione como uma caixa de ressonância da ciência e que junte sua voz ao coro dos alertas sobre a situação-limite em que a humanidade e a biosfera se encontram. Mas o FMI é o primogênito e um dos principais gendarmes da ordem econômica internacional que está condenando os homens e a biosfera a serem “tostados, assados e grelhados num horizonte de tempo de 50 anos”. Não tem, portanto, autoridade moral para emitir alertas desse gênero. “Como disse antes”, afirma acima Lagarde…

De fato, já em 2012, às vésperas da Rio+20, ela havia declarado num encontro do Center for Global Development, em Washington, que “a mudança climática é claramente um dos grandes desafios de nosso tempo, um dos grandes testes de nossa geração. Para os mais pobres e mais vulneráveis do mundo, a mudança climática não é uma possibilidade distante. É uma realidade presente” (II). E anunciava então que o FMI desenvolveria pesquisas e daria suporte analítico aos países com políticas de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE), em particular através de instrumentos fiscais, como precificação do carbono e eliminação dos subsídios. Passados cinco anos, eis o que aconteceu:

1. Os subsídios à indústria de combustíveis fósseis continuam a crescer. Em 2013, eles montavam a US$ 4,9 trilhões e em 2015 atingiram US$ 5,3 trilhões, ou 6,5% do PIB mundial, segundo um estudo recente. “A eliminação desses subsídios”, afirmam seus autores, “teria reduzido as emissões de carbono, em 2013, em 21%, e em 55%, as mortes por poluição causada pela queima de combustíveis fósseis, ao mesmo tempo em que teria elevado a renda em 4% do PIB global e o bem-estar social em 2,2%” (III). Se entendidos stricto sensu, ou seja, como privilégio fiscal ou transferência de recursos estatais para essa indústria, os subsídios dos governos do G20 – os mesmos que prometeram seu fim em 2009 – montavam em 2015 a US$ 444 bilhões (IV).

2. Imposto sobre a emissão de carbono (carbon tax). A segunda medida apoiada por Lagarde era a precificação adequada do carbono: “corrigir seus preços significa usar uma política fiscal capaz de garantir que o malefício que causamos reflita-se nos preços que pagamos” (V). Tal imposto foi sugerido já em 1973 por David Gordon Wilson (VI), do MIT, e reproposto agora, pela enésima vez, por 13 economistas, no âmbito de uma iniciativa presidida por Joseph Stiglitz e Sir Nicholas Stern (VII). O estudo sugere que este seja em 2020 de 40 a 80 dólares por tonelada de CO2 emitido e, em 2030, de 50 a 100 dólares. Não se sabe em quanto esse imposto, se adotado, contribuiria para a redução das emissões de GEE. Mas se sabe que o FMI em nada tem contribuído para viabilizá-lo. De resto, em março último, Trump descartou-o e sem o apoio dos EUA, um dos maiores produtores mundiais de petróleo, ele parece hoje mais irrealista que nunca.

Leonardo Martinez-Diaz, do World Resources Institute, percebe bem a hipocrisia do FMI: “Uma das funções centrais do FMI é a vigilância macroeconômica. (…) O Fundo deveria colocar o risco climático no diálogo com os Estados, como um item formal de suas consultas”. E, sobretudo, “considerar as despesas em resiliência como investimentos dos Estados devedores” (VIII). Mas, isso Christine Lagarde não fez, e não fará, porque prejudicaria os interesses dos credores.

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Voluntários posam nus, na geleira de Aletsch, nos Alpes suíços, durante campanha ambiental sobre o aquecimento global, em 2007 | Foto: Reprodução | Greenpeace

Quatro décadas de alertas científicos

Se é nula a credibilidade do FMI no que se refere à sua contribuição para mitigar essa situação extremamente grave, isso não altera o fato de que o diagnóstico de Lagarde baseia-se no mais consolidado consenso científico. Há décadas a ciência adverte que o aquecimento continuado da atmosfera e dos oceanos – causado sobretudo pela queima de combustíveis fósseis, pelo desmatamento e pelo surto global de carnivorismo – lançaria o século XXI num série de crescentes desastres sociais e ambientais. Quase quatro décadas atrás, em 1981, quando o aquecimento global era ainda de apenas 0,4o C acima dos anos 1880, James Hansen e colegas afirmavam num trabalho da Science (IX):

“Efeitos potenciais sobre o clima no século XXI incluem a criação de zonas propensas a secas na América do Norte e Ásia Central como parte de uma mudança nas zonas climáticas, erosão das camadas de gelo da Antártica com consequente elevação global do nível do mar e a abertura da famosa passagem do Noroeste [no Ártico]. (…) O aquecimento global projetado para o próximo século é de uma magnitude quase sem precedentes. Baseados nos cálculos de nosso modelo, estimamos que ele será de ~2,5o C para um cenário com lento crescimento de energia e um misto de combustíveis fósseis e não fósseis. Esse aquecimento excederia a temperatura durante o período antitermal (6.000 anos atrás) e o período interglacial anterior (Eemiano) e se aproximaria da temperatura do Mesozoico, a idade dos dinossauros”.

Entre 1984 e 1988, James Hansen depôs três vezes no Senado dos Estados Unidos. Na última vez, diante de 15 câmaras de televisão, projetou cenários de aquecimento global de até 1,5o C em 2019 em relação à média do período 1951-1980, como mostra a Figura 1, reproduzida a partir desse histórico documento de 1988.

Figura 1 – Projeção de aquecimento médio superficial global até 2019, segundo três cenários

O Cenário A supõe uma taxa de aumento das emissões de CO2 típica dos 20 anos anteriores a 1987, isto é, um crescimento a uma taxa de 1,5% ao ano. O Cenário B assume taxas de emissão que estacionam aproximadamente no nível de 1988. O Cenário C é de drástica redução dessas emissões atmosféricas no período 1990 – 2000. A linha contínua descreve o aquecimento observado até 1987. A faixa cinza recobre o nível pico de aquecimento durante os períodos Antitermal (6.000 anos AP) e Eemiano (120.000 anos AP). O ponto zero das observações é a média do período 1951-1980.

Fonte: “The Greenhouse Effect: Impacts on Current Global Temperature and Regional Heat Waves”, figura 3. Documento apresentado ao Senado por James Hansen em 1988. Veja-se:https://climatechange.procon.org/sourcefiles/1988_Hansen_Senate_Testimony.pdf

As projeções de Hansen são uma das mais espetaculares demonstrações de inteligência do sistema Terra na história recente da ciência, que só hoje podemos aquilatar em sua real dimensão. Seus Cenários A e B anteciparam a uma distância de 30 anos um aquecimento médio global entre ~1,1o C e 1,5o C. Foi exatamente o que aconteceu, como mostra a Figura 2

Figura 2 – Temperaturas superficiais globais em relação ao período de base 1880-1920 | Fonte:Earth Institute. Columbia University

Como se vê, desde 1970 as temperaturas médias globais têm se elevado 0,18o C por década e em 2016 elas atingiram +1,24o C em relação a 1880-1920. Mantida a aceleração do aquecimento médio global observada no triênio 2015-2017 (~0,2o C), deveremos atingir ou estar muito próximos, em 2019, do nível de aquecimento previsto no pior cenário assumido por James Hansen e colegas.

Energias fósseis x energias renováveis e de baixo carbono

Naturalmente, quem está no controle do mundo não se interessa por acurácia científica, quando esta interfere em seus planos de negócios. Os alertas de toda uma legião de cientistas no mundo todo continuam a se espatifar contra o muro inexpugnável das corporações, que impuseram e continuam a impor à humanidade e à biosfera o “Cenário A” previsto por James Hansen. Os números, melhor que quaisquer argumentos, revelam a extensão do crime: desde 1988, data do testimony de Hansen no Senado dos EUA, mais CO2 foi lançado na atmosfera do que entre 1750 e 1987, como mostra a Figura 3

Figura 3 – Emissões industriais de CO2 entre 1751 e 2014. De 1751 a 1987 foram emitidas 737 Gt (bilhões de toneladas). Entre 1988 e 2014 foram emitidas 743 Gt.  | Fonte: T. J. Blasing, “Recent Greenhouse Gas Concentrations”. Carbon Dioxide Information Analysis Center (CDIAC), Abril, 2016, baseado em Le Quéré et al. (2014) e Boden, Marland e Andres (2013).

Em 2017 teremos já ultrapassado 800 Gt de CO2 emitidos na atmosfera em quarenta anos. As corporações que lucram com essas emissões e com a destruição das florestas – em especial os xifópagos Big Oil & Big Food – venceram e continuam vencendo. Em Riad, na semana passada, Christine Lagarde acrescentou que “as decisões devem ser imediatas, o que provavelmente significará que nos próximos 50 anos o petróleo se tornará uma commodity secundária”. Foi contradita por Amin Nasser, presidente da estatal Saudi Arabian Oil Company (Aramco): “Alternativas, carros elétricos e renováveis estão definitivamente ganhando participação no mercado e estamos vendo isso. Mas décadas serão ainda necessárias antes que assumam uma participação maior na oferta de energia global” (X).

Mantido o paradigma expansivo do capitalismo (obviamente dependente das reservas restantes de petróleo, algo incerto), o prognóstico de Amin Nasser afigura-se mais credível que o de Christine Lagarde. Ele ecoa a convicção de seus pares de que a hegemonia dos combustíveis fósseis não será sequer ameaçada, quanto menos superada, por energias de baixo carbono pelos próximos dois ou três decênios. Barry K. Worthington, diretor da toda poderosa United States Energy Association, afirma, e é fato, que “nenhuma projeção credível” mostra uma participação menor que 40% dos combustíveis fósseis em 2050 (XI). Mesmo o carvão, cujo declínio iniciado nos dois últimos anos parecia a muitos ser irreversível, resiste. Nos EUA, sua produção em 2017 será 8% maior que em 2016 (XII). No mundo todo havia, em outubro de 2017, 154 unidades termelétricas movidas a carvão em construção e 113 em expansão, um número ainda superior ao das unidades que estão sendo desativadas (XIII).

Um argumento em favor da ideia de uma ainda longa hegemonia futura dos combustíveis fósseis provém de um trabalho de três pesquisadores da Universidade de Bergen, na Noruega (XIV). Os autores partem da constatação de que em 2015 o consumo energético global foi de 17 Terawatts (TW), dos quais apenas 3,9% (0,663 TW) provieram de energias eólica (0,433 TW) e fotovoltaica (0,230 TW). Assumem em seguida a projeção de que esse consumo quase dobre em 2050, atingindo 30 TW. Detectam então indícios de que a taxa de crescimento das energias eólica e fotovoltaica comece a declinar já ao longo da próxima década, saturando sua capacidade instalada não acima de 1,8 TW em 2030, o que as levaria a assumir a forma da curva de uma função logística ou sigmóide (em “S”), como mostra a Figura 4.

Figura 4 – Capacidade instalada global total de energia eólica e fotovoltaica (pontos verdes)
A linha contínua é a do modelo logístico (curva sigmóide), semelhante à evolução das energias hidrelétrica e nuclear. As linhas pontilhadas indicam um intervalo de confiança de 95%. O ponto vermelho indica os prognósticos das associoções de acionistas. O quadro inserido mostra o declínio previsto das taxas de crescimento dessas energias. | Fonte: J.P. Hansen, P.A. Narbel, D.L. Aksnes, “Limits to growth in the renewable energy sector”. Renewable and Sustainable Energy Reviews, 70, IV/2017, pp. 769-774.

A COP 23 e a “catastrófica brecha climática”

Como se sabe, abre-se hoje, 6 de novembro de 2017, em Bonn, mais uma reunião anual da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (UNFCCC), a 23ª Conferência das Partes (COP23). Sua agenda central será fazer avançar as diretrizes (rule-book) de implementação do Acordo de Paris, preparadas por um grupo de trabalho – o Ad-hoc Working Group on the Paris Agreement (APA) –, coordenado pela Nova Zelândia e pela… Arábia Saudita. Por improvável que seja a projeção de Christine Lagarde de que “nos próximos 50 anos o petróleo se tornará uma commodity secundária”, suas declarações na capital mundial do petróleo têm o mérito de reforçar o senso de urgência requerido para mais essa rodada de negociações.  Esse senso de urgência é mais que nunca necessário, pois o contexto político e ambiental em que se abre a COP23 não poderia ser mais adverso, como bem indica o quadro atual de bloqueio do Acordo, em contraste com a angustiante aceleração da degradação ambiental nos últimos meses:

1. Quase dois anos após sua assinatura, o Acordo de Paris não foi ainda ratificado (não está em vigor) por 13 países produtores e detentores das maiores reservas mundiais de petróleo, conforme mostra a tabela abaixo

Fontes: Paris Agreement – Status of Ratification U.S. | EIA Production of Crude Oil including Lease Condensate 2016

A esses 13 países que não ratificaram o Acordo, acrescentam-se os EUA, em vias de deixá-lo. De modo que mais de um terço da produção mundial de petróleo encontra-se em nações que não reconhecem oficialmente o Acordo de Paris, e não o reconhecem, declaradamente ou não, porque não têm intenção de diminuir sua produção.

(2) Em julho, reunido na China, o G20 deu uma demonstração de fraqueza ou de oportunismo ao ceder às pressões dos EUA e da Arábia Saudita para eliminar de sua declaração conjunta final qualquer menção à necessidade de financiar a adaptação dos países pobres às mudanças climáticas, condição de possibilidade do Acordo de Paris (XV).

(3) Em 18 de outubro passado, o Global Forest Watch revelou que em 2016 foram destruídos globalmente 297 mil km2 de florestas pelo avanço da agropecuária, da mineração, da indústria madeireira e de incêndios mais devastadores, criminosos e/ou exacerbados pelas mudanças climáticas (XVI). Trata-se de um recorde absoluto em área destruída e de um recorde no salto de 51% em relação a 2015, como mostra a Figura 5.

Figura 5 – Perdas de cobertura florestal global de 2011 a 2016 | Fonte: Global Forest Watch

(4) Em 30 de outubro, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) reconheceu um avanço de 3,3 ppm (partes por milhão) nas concentrações atmosféricas de CO2 no intervalo de apenas 12 meses. Essas concentrações “deram em 2016 um salto, numa velocidade recorde, atingindo seu mais alto nível em 800 mil anos”. Desde 1990, afirma o boletim da OMM, houve um aumento de 40% na forçante radiativa total (o balanço entre a energia incidente e a energia refletida de volta para o espaço pelo sistema climático da Terra) causada pelas emissões de GEE, e um aumento de 2,5% apenas em 2016 em relação a 2015 (XVII).

(5) Enfim, o oitavo Emissions Gap Report, de 2017, publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), adverte que as reduções de emissões de GEE acordadas em Paris estão muito aquém do requerido para conter o aquecimento médio global abaixo de 2o C ao longo deste século. Como faz notar Erik Solheim, diretor do (PNUMA), “as promessas atuais dos Estados cobrem não mais que um terço das reduções necessárias. (…) Os governos, o setor privado e a sociedade civil devem superar essa catastrófica brecha climática” (XVIII). E reafirma que, se os compromissos nacionais (NDCs) forem implementados, chegaremos ao final deste século com um aquecimento médio global de cerca de 3,2o C (2,9o C a 3,4o C). Mas os governos estão descumprindo até mesmo esse terço por eles prometido em 2015. Segundo Jean Jouzel, ex-vice-presidente do IPCC, “os primeiros balanços das políticas nacionais mostram que, globalmente, estamos abaixo dos engajamentos assumidos em Paris. E sem os EUA, será muito difícil pedir aos outros países que aumentem suas ambições. (…) Para manter alguma chance de permanecer abaixo dos 2o C é necessário que o pico das emissões seja atingido no mais tardar em 2020” (XIX).

Não há que se preocupar. Faltam ainda mais de dois anos…

 

[I] Citado em Anmar Frangoul, “IMF’s Lagarde: If nothing is done about climate change, we will be ‘toasted, roasted and grilled’.” CNBC, 25/X/2017: “As I’ve said before, if we don’t do anything about climate change now, in 50 years’ time we will be toasted, roasted and grilled. (…) If we don’t address those two issues — of climate change and growing inequalities — we will be moving towards a dark 50 years from now”.

[II] Cf. Lawrence MacDonald, “IMF Chief Warns of Triple Crisis – Economic, Environment, Social – Details IMF Actions to Help on Climate”. Center for Global Development, 12/VI/2012.

[III] Cf. David Coady, Ian Parry, Louis Sears, Baoping Shang, “How Large Are Global Fossil Fuel Subsidies?”. World Development, 91, 17/III/2017. Para os autores, subsídios ocorrem: “when consumer prices are below supply costs plus environmental costs and general consumption taxes”.

[IV] Cf. Elizabeth Bast, Alex Doukas, Sam Pickard, Laurie van der Burg & Shelagh Whitley, Empty Promises. G20 Subsidies to Oil, Gas and Coal Production”, Novembro de 2015, p. 9 (em rede).

[V] Citado por Lawrence MacDonald (cit.).

[VI] Cf. Chris Berdik, “The unsung inventor of the carbon tax”. The Boston Globe, 10/VIII/2014.

[VII] Cf. Carbon Price Leadership Coalition (World Bank), Report of The High-Level Commission on Carbon Prices. 29/V/2017 (em rede).

[VIII] Cf. Leonardo Martinez-Diaz, “The IMF and Climate Change: Three Things Christine Lagarde Can Do to Cement Her Legacy on Climate”. World Resources Institute, 10/X/2017.

[IX] Cf. J. Hansen et al., “Climate Impact of Increasing Atmospheric Carbon Dioxide”. Science, 213, 4511, 28/VIII/1981.

[X] Citado por A. Frangoul (cit.).

[XI] Citado por Lisa Friedman, “Trump Team to Promote Fossil Fuels and Nuclear Power at Bonn Climate Talks”. The Washington Post, 2/XI/2017.

[XII] Cf. U.S. Energy Information Administration, Short-Term Energy Outlook, Coal, 11/X/2017 (em rede).

[XIII] Cf. Adam, Morton, “The world is going slow on coal, but misinformation is distorting the facts”. The Guardian, 16/X/2017: “More coal-fired capacity is still being built than closed each year, though the gap has narrowed significantly”.

[XIV] Cf. J.P. Hansen, P.A. Narbel, D.L. Aksnes, “Limits to growth in the renewable energy sector”. Renewable and Sustainable Energy Reviews, 70, IV/2017, pp. 769-774.

[XV] Cf. John Sharman, “US ‘forces G20 to drop any mention of climate change’ in joint statement”. The Independent, 18/III/2017.

[XVI] Cf. Mikaela Weisse & Liz Goldman, “Global Tree Cover Loss Rose 51% in 2016”, GFW, 18/X/2016.

[XVII] “Greenhouse gas concentrations surge to new record”. World Meteorological Organisation, 30/X/2017..

[XVIII] Cf. Erik Solheim, The Emissions Gap Report 2017. A UN Environment Synthesis Report, p. XIII.

[XIX] Cf. Pierre Le Hir, “Réchauffement climatique: la bataille des 2o C est presque perdue”. Le Monde, 31/XII/2017.

Luiz Marques é professor livre-docente do Departamento de História do IFCH /Unicamp. Pela editora da Unicamp, publicou Giorgio Vasari, Vida de Michelangelo (1568), 2011 e Capitalismo e Colapso ambiental, 2015, 2a edição, 2016. Coordena a coleção Palavra da Arte, dedicada às fontes da historiografia artística, e participa com outros colegas do coletivo Crisálida, Crises Socioambientais Labor Interdisciplinar Debate & Atualização (crisalida.eco.br) – Publicado originalmente no Jornal da Unicamp.

A atual trajetória de colapso socioambiental é incontestável

Luiz Marques

Pensamento qualitativo e pensamento quantitativo são estratégias mentais essencialmente diferentes. De nada vale, diante de um quadro, medir a tela ou inventariar o número de pessoas e objetos representados. A abordagem quantitativa permanece externa à obra e sua interpretação não é e não se pretende científica. Ela é validada, para usar o termo consagrado por Berenson, pelo “senso de qualidade” do intérprete, o qual decorre de uma sensibilidade historicamente informada e, sobretudo, educada por um longo convívio comparativo com muitos objetos artísticos (I). Ao afirmar que a obra de arte é sempre um fenômeno “deliciosamente relativo”, ou seja, que ela se afirma na relação, antes de mais nada, com outra obra de arte, Roberto Longhi dizia algo semelhante (II).

A intenção do parágrafo precedente não é relembrar a tripartição transcendental entre o belo, o justo e o verdadeiro, mas sublinhar, por oposição ao juízo estético, a especificidade do saber científico sobre a natureza. Desde Pitágoras e Platão, o pensamento grego, e depois ocidental, traçou o destino de nossa relação epistemológica com a natureza ao optar pela transfiguração da qualidade em quantidade, seja por intermédio de uma metafísica do número e das formas geométricas, seja, modernamente, pela mensuração dos parâmetros que indicam o comportamento dos fenômenos. Essa matematização do mundo foi, como é sabido, formulada na aurora da ciência moderna pelo Il Saggiatore (1623) de Galileo: “a filosofia está escrita nesse grandíssimo livro, continuamente aberto aos nossos olhos (digo, o universo), mas não se pode entendê-lo se antes não se aprende a entender a língua e a conhecer os caracteres nos quais é escrito. Ele é escrito em língua matemática, e os caracteres são triângulos, círculos e outras figuras geométricas. Sem tais meios, é humanamente impossível entender algo” (III).

Contrariamente, portanto, ao “senso de qualidade”, capaz de gerar um juízo retoricamente persuasivo, mas que, como adverte ainda Berenson, “não pertence à categoria das coisas demonstráveis”, o próprio da ciência e sua ambição é a demonstração de um conjunto de proposições quantitativas que só admite contestação por outro conjunto de proposições quantitativas.

A trajetória de colapso socioambiental

Isso vale, por certo, para a mais incontornável e distintiva das proposições científicas de nosso tempo: a escala e rapidez crescentes das pressões deletérias exercidas pela lógica expansiva do capitalismo global sobre o sistema Terra coloca as sociedades humanas e a biodiversidade numa trajetória de colapso iminente. Definamos cada termo dessa proposição.

(1) O capitalismo é um sistema socioeconômico resultante da associação histórica entre: (a) um ordenamento jurídico fundado na propriedade privada do capital e (b) a racionalidade da ação econômica dos detentores do capital, definida pela busca da máxima remuneração do investimento. A relação desses proprietários com a natureza é determinada por essa consciência intencional do mundo e é a força motriz que impele o sistema à sua contínua expansão. No capitalismo global, a propriedade do capital concentra-se nas mãos de uma “super entidade” econômica, composta por um núcleo densamente interconectado de controladores financeiros da rede de corporações multinacionais. Num artigo intitulado “The Network of Global Corporate Control”, Stefania Vitali, James Glattfelder e Stefano Battiston, do ETH Zurich, quantificaram esse controle da economia global: “737 proprietários (top holders) acumulam 80% do controle sobre o valor de todas as corporações multinacionais” (IV).

(2) Define-se sistema Terra, não como uma ainda controversa “hipótese Gaia”, mas como o conjunto das interações mensuráveis entre a atmosfera, a biosfera, a geosfera, a pedosfera, a hidrosfera e a criosfera, interações decisivamente afetadas nos últimos decênios pela interferência antrópica (V).

(3) Por colapso socioambiental, deve-se entender uma transição abrupta para outro estado de equilíbrio do sistema Terra, estado cujo grau de alteridade em relação aos parâmetros do Holoceno é ainda incerto, mas que deve implicar com toda a probabilidade escassez hídrica, desestabilização climática e um aquecimento médio global não inferior a 3º C. Esse nível de aquecimento médio global arremessará as sociedades humanas a abismos de fome, insalubridade, violência, precariedade e mortalidade, condenando ao mesmo tempo à extinção um número imenso de outras espécies em todos os ecossistemas do planeta.

(4) Por iminente, enfim, deve-se entender um horizonte de tempo não posterior à segunda metade do século, sem excluir mudanças decisivas já nos próximos dois decênios.

A proposição de que estamos numa trajetória de colapso socioambiental iminente alicerça-se em conhecimento cumulativo. Dados, monitoramentos conduzidos ao longo de decênios, modelos estatísticos e projeções confirmadas pela observação convergem para conferir a essa proposição uma incerteza cada vez menor e constituem hoje, por certo, um dos mais consolidados consensos científicos da história do saber sobre a natureza e sobre nossa interação destrutiva e autodestrutiva com ela.

A respeito dessa proposição gravíssima, a comunidade científica tem lançado “alertas vermelhos” recorrentes, cuja linguagem não pode ser acusada de eufemismo. Lembremos os mais recentes em ordem cronológica. Em 1992, por ocasião da ECO-92 no Rio de Janeiro, 1.700 cientistas publicaram a “Advertência dos Cientistas do Mundo à Humanidade”, na qual reafirmavam claramente a iminência desse colapso:

“Não mais que uma ou poucas décadas restam antes que a chance de evitar as ameaças atuais seja perdida, diminuindo incomensuravelmente as perspectivas da humanidade”.

Em 2007, essa iminência era reiterada pelo quarto relatório do IPCC, o mais importante coletivo de pesquisadores das mudanças climáticas (VI):

“Qualquer meta de estabilização das concentrações de CO2 acima de 450 ppm [partes por milhão] tem uma probabilidade significativa de desencadear um evento climático de larga escala”. 

Note-se que em 2013 ultrapassamos 400 ppm e em abril de 2017 (VII) o Observatório de Mauna Loa, no Havaí, registrou pela primeira vez concentrações atmosféricas de 410 ppm de CO2, como mostra a Figura 1.

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Figura 1: Concentrações atmosféricas de CO2 em partes por milhão (ppm) de 1700 a abril de 2017.  A linha mais grossa indica as mensurações no topo do monte Mauna Loa, Havaí, iniciadas em 1958 (Curva de Keeling) | Fonte: National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA)

No período mostrado por esse gráfico (1700 – 2017), houve aumento de quase 50% nessas concentrações, com uma inequívoca aceleração desse processo no século XXI, como mostra detalhadamente a Figura 2.

 

Figura 2 – Taxas de crescimento das concentrações atmosféricas de CO2 em Mauna Loa, Havaí (1960 – 2016). Fonte: National Oceanic and Atmospherica Administration, NOAA, EUA.

Entre 1960 e 1997, houve apenas quatro aumentos anuais superiores a 2 ppm e nenhum superior a 2,5 ppm. Mas entre 1998 e 2016 registraram-se onze aumentos anuais superiores a 2 ppm e seis aumentos anuais superiores a 2,5 ppm, com três recordes batidos desde 1998: 2,93 ppm (1998); 3,03 ppm (2015) e 2,77 ppm (2016). E desde 2010, enfim, registrou-se apenas um aumento anual inferior a 2 ppm. Mantido um aumento médio futuro de 2,5 ppm/ano, atingiremos os temidos 450 ppm já em 2033, após os quais, como afirma o IPCC, aumentam as probabilidades de “se desencadear um evento climático de larga escala”.

Em 2013, outro alerta, intitulado “Consenso Científico sobre a Manutenção dos Sistemas de Suporte da Vida da Humanidade no século XXI”, assinado por mais de três mil cientistas, alertava mais uma vez para a iminência de um colapso socioambiental (VIII):

“A Terra está rapidamente se aproximando de um ponto crítico. Os impactos humanos estão causando níveis alarmantes de dano ao nosso planeta. Como cientistas que estudamos a interação dos humanos com o resto da biosfera, usando uma ampla gama de abordagens, concordamos ser esmagadora a evidência de que os humanos estão degradando os sistemas de sustentação da vida. (…) Quando as crianças de hoje atingirem a meia-idade é extremamente provável que os sistemas de sustentação da vida terão sido irremediavelmente danificados pela magnitude, extensão global e combinação desses estressores causados pelos humanos [desequilíbrios climáticos, extinções, perda generalizada de diversos ecossistemas, poluição, crescimento populacional e padrões de consumo], a menos que tomemos ações imediatas para assegurar um futuro sustentável e de alta qualidade. Como membros da comunidade científica ativamente envolvidos em avaliar os impactos biológicos e sociais das mudanças globais, estamos disparando esse alarme”.

Há dois meses, enfim, oito cientistas reavaliaram o apelo de 1992 e lançaram a “Advertência dos Cientistas do Mundo à Humanidade – Segundo Aviso” (IX):

Desde 1992, com exceção da estabilização da camada de ozônio estratosférico, a humanidade fracassou em fazer progressos suficientes na resolução geral desses desafios ambientais anunciados, sendo que a maioria deles está piorando de forma alarmante. Especialmente perturbadora é a trajetória atual das mudanças climáticas potencialmente catastróficas, devidas ao aumento dos gases de efeito estufa emitidos pela queima de combustíveis fósseis, desmatamento e produção agropecuária – particularmente do gado ruminante para consumo de carne. Além disso, desencadeamos um evento de extinção em massa, o sexto em cerca de 540 milhões de anos, no âmbito do qual muitas formas de vida atuais podem ser aniquiladas ou, ao menos, condenadas à extinção até o final deste século.

A resposta da comunidade científica a esse “Segundo Aviso” foi extraordinariamente vigorosa. Ele conta hoje com mais de 15 mil assinaturas de pesquisadores e cientistas de 180 países, entre as quais as de James Hansen, ex-diretor do Goddard Institute for Space Studies (NASA – GISS, Columbia University); de Matthew Hansen, do MODIS Land Science Team (NASA); de Will Steffen e Thomas Hahn (IPBES), ambos do Stockholm Resilience Centre; de Stefan Rahmstorf, diretor do Potsdam Institute for Climate Impact Research; de Daniel Pauly, diretor do The Sea Around Us (British Columbia University); de Jan Zalasiewicz, do Anthropocene Working Group (Subcomissão da Estratigrafia do Quaternário); e de Paul Ehrlich e Edward O. Wilson, de sete laureados com o Prêmio Nobel e de pesquisadores de todas as áreas das principais universidades brasileiras e do mundo todo.

É claro que há ainda muitas incertezas acerca da evolução do sistema Terra, mas essas incertezas estão diminuindo e são, sobretudo, de segunda ordem. A proposição central da ciência de que o aumento da interferência antrópica no sistema Terra está nos conduzindo a um colapso socioambiental iminente constitui o conteúdo comum de todos os alertas emitidos pelos coletivos de cientistas acima citados. A menos que se negue frontalmente esse consenso ou que se avancem elementos contrários quantitativamente relevantes, essa proposição mostra-se incontestável e as atuais tentativas de contestá-la não pertencem ao âmbito da ciência.

Bloqueio psicológico e bloqueio epistemológico

Isso posto, os fatos e alertas científicos chocam-se contra a barreira do negacionismo fomentado pelas corporações ou são metabolizados e neutralizados por um bloqueio ao mesmo tempo psicológico e epistemológico da maior parte das pessoas, inclusive entre as mais escolarizadas. O bloqueio psicológico oferece o último refúgio a um otimismo não substanciado por dados relevantes. Ele é bem compreensível, haja vista o teor da mensagem. O bloqueio epistemológico radica na necessidade de sustentar a hipótese de que o capitalismo global pode avançar, inclusive rapidamente, nas duas direções básicas requeridas pela ciência:

(1) reduzir a zero as emissões de carbono nos próximos dois decênios através de mecanismos indutores próprios do mercado (fim dos subsídios aos combustíveis fósseis, taxa carbono etc);

(2) honrar os compromissos assumidos nos acordos diplomáticos, tais como o Protocolo de Kyoto, as 20 Metas de Aichi (Aichi Biodiversity Targets) (X), o Acordo de Paris, etc.

As evidências contra essa hipótese de um capitalismo tendente ao “sustentável” são acachapantes. As emissões e concentrações atmosféricas de carbono não estão se estabilizando e não devem parar de aumentar nos dois próximos decênios. O Protocolo de Kyoto e as Metas de Aichi para 2020 fracassaram e os prognósticos para o Acordo de Paris são os piores possíveis, como demonstrado por um artigo publicado na Nature em agosto último, e já comentado nesta coluna (XI).

As emissões de GEE continuam aumentando

Uma viga mestra desse bloqueio epistemológico é a afirmação de que as emissões globais de GEE estão se estabilizando. Há de fato tendência à estabilização nas emissões relativas à produção de energia, por causa, sobretudo, da maior disponibilidade e competitividade do gás natural, o que gerou em 2016 diminuição de 1,7% no consumo global de carvão (-53 mtoe) em relação ao ano anterior, e isso pelo segundo ano consecutivo (XII). Eis os últimos dados de consumo de combustíveis fósseis em milhões de toneladas de energia equivalente ao petróleo (mtoe):

Fonte: BP Statistical Review of World Energy. Junho de 2017 (em rede).

Mas os últimos dados da Emission Database for Global Atmospheric Research (EDGAR) mostram que as emissões de GEE como um todo continuam a aumentar, atingindo 53,4 GtCO2-eq em 2016, como certifica a Figura 3

Figura 3 – Emissões globais de Gases de Efeito Estufa (GEE) entre 1990 e 2016. | Fonte: Emission Database for Global Atmospheric Research (EDGAR)

É significativo que um eminente representante desse bloqueio epistemológico, Lord Nicholas Stern, Presidente da British Academy, tenha visto na figura acima motivo para comemorar: “Esses resultados são uma bem-vinda indicação de que estamos nos aproximando do pico das emissões anuais de gases de efeito estufa” (XIII). Esse comentário de Stern lembra as peripécias pré-copernicanas do geocentrismo ptolomaico. Lá se tratava de “salvar” a hipótese geocêntrica. Aqui, de “salvar” a hipótese de que o capitalismo pode no limite nos desviar do colapso socioambiental. Pois esse gráfico simplesmente não mostra estabilização. Ele diz alto e bom som que em 2010 o mundo emitiu 50 GtCO2-eq e que houve em 2016 aumento dessas emissões da ordem de 7%. Definitivamente não há motivo para considerar tal aumento bem-vindo. Ele diz ainda, para concluir, três coisas extremamente importantes:

(1) Dados os esforços de Trump para reabilitar o carvão, é ainda prematuro afirmar que a tendente estabilização das emissões de CO2 relacionadas à produção de energia anuncie uma sucessiva diminuição. Aqui há motivo para alguma esperança, mas o maior problema é que essas emissões ligadas à produção de energia correspondem a apenas 60% dos GEE (~32 GtCO2-eq).

(2) 19% das emissões de GEE em 2016 provieram do metano, com grande contribuição da atividade entérica e dos resíduos dos ruminantes, cujo rebanho aumentou 20,5% entre 1992 e 2016, atingindo agora quase quatro bilhões de cabeças (XIV).

(3) O fator que mais empurrou a curva das emissões para cima (mancha cinza no topo do gráfico) foi a liberação de GEE pela agricultura, pelo desmatamento e pelos incêndios das florestas e das turfeiras (Land Use, Land Use change and Forestry, LULUCF).

Os pontos 2 e 3 mostram, mais uma vez, que o irmão gêmeo do Big Oil é o Big Food (inclusive para alimentar os animais que comemos) e que não nos desviaremos da trajetória de colapso ambiental sem uma profunda revisão do nosso sistema alimentar, transformado em commodities,  baseado no comércio global e em proteínas animais.

Referências

[I] Cf. Bernard Berenson, The sense of qualityStudy and Criticism of Italian Art (1901), Nova York, 1962.

[II] Roberto Longhi, “Proposte per una critica d’arte”. Paragone, 1, 1950: “L’opera d’arte, dal vaso dell’artigiano greco alla volta Sistina, è sempre un capolavoro squisitamente relativo. L’opera non sta mai da sola. È sempre un rapporto. Per cominciare: almeno un rapporto con un’altra opera d’arte”. Em 1923, num pequeno texto provocador, Le Problème des Musées, Paul Valéry antecipava esse paradoxo longhiano entre a singularidade do termo “obra-prima” e seu caráter relativo. Para Valéry, as obras de arte dispostas nas galerias de um museu: “quanto mais belas, quanto mais efeitos excepcionais da ambição humana, mais devem ser distintas. São objetos raros e seus autores bem gostariam que fossem únicas”.

[III] Cf. Alexandre Koyré, “Galilée et Platon” (1943). Études d’histoire de la pensée scientifique, Paris, 1973, pp. 166-195.

[IV] Cf. S. Vitali, J. B. Glattfelder, S. Battiston, “The Network of Global Corporate Control” Plos One, 26/X/2011: “We find that only 737 top holders accumulate 80% of the control over the value of all TNCs (Transnational Corporations) (…). A large portion of control flows to a small tightly-knit core of financial institutions. This core can be seen as an economic ‘super-entity’”.

[V] A ciência que estuda o comportamento desse conjunto extremamente complexo de interações, chamada ciência do sistema Terra (Earth system science), não se concebe como uma disciplina a mais entre outras, mas como uma nova relação entre ciências humanas e ciências da natureza, de resto impreterível na nova época geológico-cultural a que se dá o nome Antropoceno.

[VI] IPCC AR4 (2007) Working Group II: Impacts, Adaptation and Vulnerability: “Any CO2 stabilisation target above 450 ppm is associated with a significant probability of triggering a large-scale climatic event”.

[VII] Cf. Brian Kahn, “We Just Breached the 410 PPM Threshold for CO2. Carbon dioxide has not reached this height in millions of years”. Scientific American, 21/IV/2017.

[VIII] Scientific Consensus on Maintaining Humanity’s Life Support Systems in the 21st Century: “Earth is rapidly approaching a tipping point. Human impacts are causing alarming levels of harm to our planet. As scientists who study the interaction of people with the rest of the biosphere using a wide range of approaches, we agree that the evidence that humans are damaging their ecological life-support systems is overwhelming. We further agree that, based on the best scientific information available, human quality of life will suffer substantial degradation by the year 2050 if we continue on our current path. By the time today’s children reach middle age, it is extremely likely that Earth’s life-support systems, critical for human prosperity and existence, will be irretrievably damaged by the magnitude, global extent, and combination of these human-caused environmental stressors [, unless we take concrete, immediate actions to ensure a sustainable, high-quality future. As members of the scientific community actively involved in assessing the biological and societal impacts of global change, we are sounding this alarm to the world”.

[IX] Cf. William J. Ripple, Christopher Wolf, Mauro Galetti, Thomas M Newsome, Mohammed Alamgir, Eileen Crist, Mahmoud I. Mahmoud, William F. Laurance, “World Scientists’ Warning to Humanity: A Second Notice”. O manifesto será proximamente publicado na revista Bioscience.

[X] Essas 20 metas subdividem-se em 56 objetivos e são agrupadas em 5 grandes estratégias para a conservação da biodiversidade entre 2011 e 2020. Veja-se http://www.cbd.int/sp/targets/.

[XI] Cf. David G. Victo, Keigo Akimoto, Yoichi Kaya, Mitsutsune Yamaguchi, Danny Cullenward & Cameron Hepburn, “Prove Paris was more than paper promises”, Nature, 548, 1/VIII/2017:  “No major advanced industrialized country is on track to meet its pledges to control the greenhouse-gas emissions that cause climate change. Wishful thinking and bravado are eclipsing reality”. Veja-se “Esperanças científicas e fatos políticos básicos sobre o Acordo de Paris”. Jornal da Unicamp, 25/IX/2017

[XII] Cf. BP Statistical Review of World Energy. Junho de 2017 (em rede).

[XIII] Citado por Damian Carrington, “Global carbon emissions stood still in 2016, offering climate hope”. The Guardian, 28/IX/2017: “These results are a welcome indication that we are nearing the peak in global annual emissions of greenhouse gases”.

[XIV] Veja-se esse dado em William J. Ripple, Christopher Wolf, Mauro Galetti, Thomas M Newsome, Mohammed Alamgir, Eileen Crist, Mahmoud I. Mahmoud, William F. Laurance, “World Scientists’ Warning to Humanity: A Second Notice”.

Luiz Marques é professor livre-docente do Departamento de História do IFCH /Unicamp. Pela editora da Unicamp, publicou Giorgio Vasari, Vida de Michelangelo (1568), 2011 e Capitalismo e Colapso ambiental, 2015, 2a edição, 2016. Coordena a coleção Palavra da Arte, dedicada às fontes da historiografia artística, e participa com outros colegas do coletivo Crisálida, Crises Socioambientais Labor Interdisciplinar Debate & Atualização (crisalida.eco.br) – Publicado originalmente no Jornal da Unicamp.

 

Ação e reação: descaso com oceanos gera consequências para todo planeta

O que inundações no Sul do Brasil, o aumento da frota de automóveis e a crescente produção de lixo têm em comum? Para os oceanos, tudo! É na porção aquática do planeta que os efeitos das ações cotidianas dos seres humanos são sentidos e também causam reações. Engana-se quem pensa que um papel jogado pela janela, o uso excessivo de produtos descartáveis e combustíveis fósseis não influenciam nos mares do planeta – e, consequentemente, no clima e na qualidade de vida de onde mora.

O grande problema é que se está matando de forma silenciosa a maior parte do planeta, já que 71% da Terra são cobertas de água em estado líquido. Segundo a pesquisadora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e vice-presidente da Associação Mar Brasil, Camila Domit, os oceanos são a base para a sobrevivência da humanidade. “São eles que garantem a produção do oxigênio e recursos para nossa alimentação e desenvolvimento econômico, como produção de óleo e gás. A biodiversidade aquática é imensa e grande parte ainda desconhecida. É por via marítima que fazemos conexão entre diferentes continentes, comércio e integração, além de proporcionar uma excelente fonte de lazer, esportes e, acima de tudo, paz e tranquilidade”, analisa a bióloga que também é membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

Os mares e os oceanos são considerados os verdadeiros pulmões do mundo, pois abrigam espécies de algas marinhas e cianobactérias responsáveis pela maior parte da produção de oxigênio disponível na atmosfera. Também atuam no equilíbrio climático do planeta, absorvendo grande parte do calor que tem sido gerado com a intensificação do efeito estufa, como explica o analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza, Luiz Faraco. “Os oceanos têm uma relação ‘de mão dupla’ com o clima: influenciam fortemente na temperatura do planeta, e ao mesmo tempo são afetados pela mudança climática. Estudos recentes demonstram que os oceanos estão se aquecendo a uma taxa 13% mais rápida do que imaginávamos e em regiões cada vez mais profundas”, explica.

A consequência do aumento do calor armazenado nos oceanos afeta a temperatura da superfície da água, as correntes marítimas e também o nível do mar, além de a mudança climática estar entre as principais causas de perda de biodiversidade no mundo, juntamente com a degradação de habitats e a invasão biológica por espécies exóticas, explica André Ferretti, gerente de estratégias de conservação da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza. O aquecimento provoca mudanças nas correntes marítimas e massas de ar, o que aumenta a frequência e intensidade de grandes tempestades, furações e tufões, além de influenciar o maior derretimento de geleiras, aumento do nível do mar e extinção de muitas espécies vegetais e animais. Mesmo que fosse possível parar todas as causas de mudança climática hoje, ainda assim teríamos que lidar com todo o impacto que já causamos e que nos afeta diretamente”, analisa Ferretti.

Referência internacional em bodysurf, Henrique Pistilli, surfou ao longo de sua carreira as cinco maiores e mais perigosas ondas do mundo. O atleta, conhecido como Homem Peixe, também tem notado alterações ambientais em diversos lugares, entre eles nas correntes de ar em Florianópolis (SC), na vegetação em Fernando de Noronha (PE), e ainda na vida marinha da Bahia de Guanabara (RJ), da Indonésia, e do Havaí. “Os ciclos estão mudando. Já notamos chuva em época de seca em Noronha, por exemplo, e fases em que não deveria haver ondas, como de junho a novembro, e vemos um mar bem movimentado nessa época”, descreve.

Essas mudanças observadas por Pistilli são agravadas por problemas como a poluição, que prejudica a qualidade da água e afeta a existência de diversas espécies. Camila Domit alerta que hoje vivemos o processo inverso, de tentar remediar uma situação que poderia ser evitada. “O lixo que está nos oceanos, levando várias espécies a óbito, direta ou indiretamente, não chegou lá sozinho e é o efeito de cada um de nós, que somado, leva a um efeito gigantesco”, reforça. Ela explica que grande parte do dinheiro e do tempo gasto poderia ser evitado ou corrigido com mudanças de comportamento, como consumo consciente e responsável. “Não podemos mais remediar. Temos que evoluir e andar para frente. Já passou da hora de investirmos em um sistema de energia limpa e levar o pensamento sustentável para a indústria, universidades, cidades, comércio”, afirma ela.

Henrique Pistilli soma forças com os especialistas ao afirmar: “estamos assassinando o mar. O oceano não tem fronteiras. Encontrei lixo de outros continentes na praia em Fernando de Noronha e esse lixo remoto é que traz o alerta de que está tudo conectado e que a gente precisa tomar as rédeas dos nossos comportamentos. O problema está debaixo do nosso nariz e meu receio é termos um oceano vazio, um cemitério de águas”, aponta.

Henrique Pistili soma vozes à Ferretti e fala sobre o papel das instituições no processo de combate à mudança climática. “A indústria e a economia acham que crescer é igual a se desenvolver, mas estão consumindo o mundo natural. Uma pesquisa do Projeto Tamar aponta que até 2050 vai haver mais lixo do que peixe nas águas”, fala. Para ele, a sociedade é agente central na busca por uma vida mais sustentável e precisa estar atenta aos seus hábitos. “As pessoas estão míopes só vendo o mar como abastecimento de água. A natureza é muito sábia, cria embalagens no tempo que precisam durar, como uma casca de fruta que se reintegra rapidamente ao ambiente. Por que usamos um copo ou garrafa plástica que vai levar mil anos para se decompor? O consumo do ser humano moderno é mimado, aperta um botão e acende a luz, abre a torneira e sai água, vivendo dentro de uma caixa fechada na cidade achando que tudo isso é infinito. É preciso trabalhar a visão de mundo”, conclui.

Futuro sustentável

Em junho deste ano, a ONU realizou pela primeira vez a Ocean Conference. O evento, que aproveitou a data do Dia Mundial dos Oceanos, foi realizado em Nova Iorque (EUA), para discutir o 14º item dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – uma agenda estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU), composta por 17 objetivos e que deve ser implementada por todos os países até 2030. Entre os temas abordados, estão a erradicação da fome, igualdade de gênero, crescimento econômico ordenado e a conservação e uso sustentável da natureza. O 14º objetivo diz respeito à “Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável”.

Mais do que apenas teoria, a conferência realizou uma “chamada para ação” de parceiros e voluntários para apoiar a implementação do Objetivo 14, por meio de compromissos voluntários. Entre as mais de 1.300 iniciativas cadastradas por organizações de todo o mundo, a brasileira Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza apresentou quatro estratégias para proteger a área marinha brasileira, que conta com apenas 1,5% de área legalmente protegida – enquanto os compromissos assumidos pelo país no âmbito das Metas de Aichi da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CDB) determinam que pelo menos 10% de áreas marinhas e costeiras deverão ser conservadas por meio de sistemas de áreas protegidas até 2020.

Os quatro compromissos assumidos pela Fundação Grupo Boticário são: o apoio à criação e implementação de Unidades de Conservação Marinhas por meio de políticas públicas, apoio à projetos de conservação marinha e geração de informação científica de qualidade; realização de um simpósio dedicado ao tema de Unidades de Conservação Marinhas e a mobilização da sociedade por meio de estratégias de conservação.

Na opinião de Malu Nunes, diretora executiva da Fundação Grupo Boticário, esse é um caminho para mobilizar os diferentes setores da sociedade em prol da proteção dos oceanos. “A conservação da natureza não passa apenas pelas florestas e a Conferência dos Oceanos é a materialização disso. Apoiar e viabilizar iniciativas que promovam a proteção e conservação da biodiversidade é vital para a sobrevivência da nossa sociedade e do bem-estar de todo o planeta”, finaliza.

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Os princípios da pegada hídrica

A pegada hídrica é definida como o volume de água total usada durante a produção e consumo de bens e serviços, bem como o consumo direto e indireto no processo de produção. O uso de água ocorre, em sua maioria, na produção agrícola, destacando também um número significativo de volume de água consumida e poluída, derivada dos setores industriais e domésticos. Portanto, determinar a pegada hídrica é tornar possível a quantificação do consumo de água total ao longo de sua cadeia produtiva.

No início de 1990 o conceito de Pegada Ecológica foi introduzido, por William Rees e Matthis Wackemagel, como uma medida da apropriação humana das áreas biologicamente produtivas. Cerca de doze anos depois. Foi lançado em Delf, na Holanda um conceito similar denominado de Pegada Hídrica (PH) para medir a apropriação humana da água doce no globo na reunião de peritos sobre comércio internacional de água virtual. Muito embora ambos os conceitos tenham raízes e métodos de medição diferentes, em alguns aspectos os dois conceitos têm em comum o fato de traduzirem o uso de recursos naturais pela humanidade.

No Brasil, existe a Lei nº 9.433/1997, também conhecida como Lei das Águas que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Singreh). Segundo a Lei das Águas, a Política Nacional de Recursos Hídricos tem seis fundamentos. A água é considerada um bem de domínio público e um recurso natural limitado, dotado de valor econômico.

A Lei prevê que a gestão dos recursos hídricos deve proporcionar os usos múltiplos das águas, de forma descentralizada e participativa, contando com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades. Também determina que, em situações de escassez, o uso prioritário da água é para o consumo humano e para a dessedentação de animais. Outro fundamento é o de que a bacia hidrográfica é a unidade de atuação do Singreh e de implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos.

O segundo artigo da Lei explicita os objetivos da PNRH: assegurar a disponibilidade de água de qualidade às gerações presentes e futuras, promover uma utilização racional e integrada dos recursos hídricos e a prevenção e defesa contra eventos hidrológicos (chuvas, secas e enchentes), sejam eles naturais sejam decorrentes do mau uso dos recursos naturais.

O território brasileiro contém cerca de 12% de toda a água doce do planeta. Ao todo, são 200 mil microbacias espalhadas em 12 regiões hidrográficas, como as bacias do São Francisco, do Paraná e a Amazônica (a mais extensa do mundo e 60% dela localizada no Brasil). É um enorme potencial hídrico, capaz de prover um volume de água por pessoa 19 vezes superior ao mínimo estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) – de 1.700 m³/s por habitante por ano.

Apesar da abundância, os recursos hídricos brasileiros não são inesgotáveis. O acesso à água não é igual para todos. As características geográficas de cada região e as mudanças de vazão dos rios, que ocorrem devido às variações climáticas ao longo do ano, afetam a distribuição.

A NBR ISO 14046 de 06/2017 – Gestão ambiental — Pegada hídrica — Princípios, requisitos e diretrizes especifica princípios, requisitos e diretrizes relacionados com a avaliação da pegada hídrica de produtos, processos e organizações com base na avaliação do ciclo de vida (ACV). Esta norma fornece princípios, requisitos e diretrizes para conduzir e relatar uma avaliação da pegada hídrica como uma avaliação única e individual, ou como parte de uma avaliação ambiental mais abrangente.

Somente as emissões atmosféricas e do solo que impactam na qualidade da água estão incluídas na avaliação, de forma que nem todas as emissões atmosféricas e do solo estão inclusas. O resultado de uma avaliação da pegada hídrica é um valor único ou um perfil dos resultados dos indicadores de impacto. Considerando que o relato está dentro do escopo desta norma, a comunicação dos resultados da pegada hídrica, por exemplo, sob a forma de rótulos ou declarações, está fora do escopo desta norma. Os requisitos específicos e diretrizes para as organizações são dados no Anexo A.

Pode-se definir a pegada hídrica com a (s) métrica (s) que quantifica (m) os impactos ambientais potenciais relacionados à água. Se os impactos ambientais potenciais relacionados à água não forem completamente avaliados, então o termo “pegada hídrica” só pode ser aplicado com um qualificador. Um qualificador é uma ou várias palavras adicionais usadas em conjunto com o termo “pegada hídrica” para descrever a (s) categoria (s) de impacto estudada (s) na avaliação da pegada hídrica como, por exemplo, “pegada de escassez hídrica”, “pegada de eutrofização hídrica”, “pegada hídrica não abrangente ”.

Assim, pode-se dizer que a água é um recurso natural essencial. A questão da água e a sua gestão tem se tornado cada vez mais central no debate global sobre o desenvolvimento sustentável. Este interesse tem sido impulsionado pela demanda crescente de água, aumento da escassez em muitas áreas e/ou degradação da qualidade da água. Isso leva à necessidade de uma melhor compreensão dos impactos relacionados com a água como base para uma melhor gestão da água em nível local, regional, nacional e global. É desejável, portanto, possuir as técnicas de avaliação apropriadas que possam ser internacionalmente utilizadas de forma consistente.

Uma das técnicas em desenvolvimento para este fim é a avaliação da pegada hídrica. Há uma demanda crescente para avaliação e elaboração de relatórios das pegadas hídricas. Existem várias metodologias para isto e, atualmente, estas metodologias enfatizam diferentes aspectos relacionados à água. Existe, portanto, uma necessidade de garantir a consistência na avaliação e no relato das pegadas hídricas. Espera-se que esta norma venha a beneficiar organizações, governos e outras partes interessadas em todo o mundo, proporcionando a transparência, consistência, reprodutibilidade e credibilidade para avaliar e reportar a pegada hídrica de produtos, processos ou organizações.

Uma avaliação da pegada hídrica realizada de acordo com esta norma: é baseada em uma avaliação do ciclo de vida (de acordo com a NBR ISO 14044); é modular (ou seja, as pegadas hídricas de diferentes estágios do ciclo de vida podem ser somadas para representar a pegada hídrica); identifica os impactos ambientais potenciais relacionados à água; inclui as coberturas geográficas e temporais pertinentes; identifica a quantidade de água utilizada e as mudanças na qualidade da água; utiliza o conhecimento hidrológico.

Uma avaliação da pegada hídrica pode ajudar a: avaliar a magnitude dos impactos ambientais potenciais relacionados à água; identificar oportunidades de reduzir os impactos ambientais potenciais relacionados à água associados aos produtos em diferentes estágios do seu ciclo de vida, bem como aos processos e organizações; gestão estratégica de riscos relacionados à água; promover a eficiência hídrica e a otimização da gestão da água em produtos, processos e níveis organizacionais; informar aos tomadores de decisão na indústria, governo ou órgãos não governamentais sobre os seus impactos ambientais potenciais relacionados à água (por exemplo, com o propósito de planejamento estratégico, definição de prioridades, projeto ou redesenho de produto ou processo, decisões sobre investimento de recursos); fornecimento de informações consistentes e confiáveis, baseadas em evidências científicas para relatar os resultados da pegada hídrica.

Uma avaliação da pegada hídrica por si só não é suficiente para descrever todos os impactos ambientais potenciais de produtos, processos ou organizações. A avaliação da pegada hídrica de acordo com esta norma pode ser realizada e relatada como uma avaliação única e individual, onde apenas os impactos relacionados à água são avaliados, ou como parte de uma avaliação do ciclo de vida, onde é considerado um conjunto abrangente de impactos ambientais e não apenas de impactos relacionados à água.

Nesta norma, o termo “pegada hídrica” só é usado quando for o resultado de uma avaliação de impacto. O escopo específico da avaliação da pegada hídrica é definido pelos usuários desta norma, de acordo com os seus requisitos. Nesta norma, o termo “produto” inclui serviços. Nesta norma, o termo “impactos ambientais” inclui categorias geralmente encontradas em modelos de impacto utilizados na avaliação do ciclo de vida, como os impactos sobre os ecossistemas, a saúde humana e sobre os recursos. Relatar é diferente de comunicar. Requisitos e diretrizes para a elaboração de relatórios estão incluídos nesta norma, no entanto os requisitos e diretrizes para a comunicação, como rótulos ou declarações ambientais, estão fora do escopo desta norma.

Alguns princípios são fundamentais e devem ser usados como diretrizes nas decisões relativas ao planejamento, realização e relato da avaliação da pegada hídrica. A avaliação da pegada hídrica de acordo com esta norma pode ser realizada e relatada como uma avaliação única e individual (onde apenas os impactos ambientais potenciais relacionados à água são avaliados), ou como parte de uma avaliação do ciclo de vida (onde são levados em consideração todos os impactos ambientais potenciais pertinentes, e não apenas os impactos ambientais potenciais relacionados à água).

Convém que a avaliação da pegada hídrica seja abrangente e considere todos os atributos ou aspectos pertinentes relacionados ao ambiente natural, saúde humana e recursos. Ao considerar todos os atributos e aspectos pertinentes dentro de um estudo, em um cruzamento de perspectivas, as compensações potenciais podem ser identificadas e avaliadas. A avaliação da pegada hídrica do produto considera todos os estágios do ciclo de vida deste produto como apropriados, desde a aquisição da matéria-prima até a disposição final.

Por meio de um panorama e perspectiva sistemáticos, a transferência de uma carga ambiental potencial entre os estágios do ciclo de vida ou processos individuais podem ser identificados e possivelmente evitados. Uma avaliação da pegada hídrica de uma organização adota uma perspectiva de ciclo de vida com base em todas as suas atividades. Se apropriada e justificada, a avaliação da pegada hídrica pode ser restrita a um ou vários estágios do ciclo de vida.

A avaliação da pegada hídrica avalia o impacto ambiental potencial relacionado à água associada a um produto, processo ou organização. Impactos econômicos ou sociais estão, tipicamente, fora do escopo da avaliação da pegada hídrica. Outras ferramentas podem ser combinadas com a avaliação da pegada hídrica para avaliações mais extensas e complementares. A avaliação da pegada hídrica está relacionada à unidade funcional e ao (s) resultado (s) calculado (s) relativos a essa unidade funcional.

Uma avaliação da pegada hídrica é uma técnica iterativa. As fases individuais de uma avaliação da pegada hídrica utilizam os resultados de outras fases. A abordagem iterativa dentro e entre as fases contribui para a abrangência e consistência do estudo e dos resultados relatados. Informação suficiente e apropriada é divulgada a fim de permitir que os usuários da avaliação da pegada hídrica tomem decisões com confiança razoável.

Dados e métodos são selecionados de modo que sejam apropriados à avaliação da pegada hídrica. Todos os dados que fornecem uma contribuição significativa para a pegada hídrica são incluídos no inventário. Pressupostos, métodos e dados são aplicados da mesma forma em toda a avaliação da pegada hídrica para se chegar a conclusões em conformidade com a definição de objetivo e escopo. Desvios e incertezas são reduzidos quando praticável.

As decisões no âmbito de uma avaliação da pegada hídrica são preferencialmente baseadas nas ciências naturais. Se isso não for possível, outras abordagens científicas (por exemplo, das ciências sociais ou econômicas) podem ser utilizadas ou convenções internacionais podem ser referenciadas. Caso não exista uma base científica nem seja possível uma justificativa fundamentada em outras abordagens científicas ou convenções internacionais, as decisões podem, de forma apropriada, ser fundamentadas em escolhas de valor.

A avaliação da pegada hídrica é conduzida em uma escala e resolução (por exemplo, uma bacia hidrográfica), que fornecem resultados pertinentes de acordo com o objetivo e escopo do estudo e leva em conta o contexto local. A pegada hídrica considera todos os atributos ou aspectos ambientalmente pertinentes do ambiente natural, saúde humana e recursos relacionados com a água (incluindo a disponibilidade e a degradação da água). Uma avaliação não abrangente traz o risco de não se levar em conta a transferência de poluição de uma categoria de impacto para outra.

Uma avaliação da pegada hídrica aborda os impactos ambientais potenciais relacionados à água associada a um produto, processo ou organização. Uma avaliação da pegada hídrica de acordo com esta norma deve incluir as quatro fases da avaliação do ciclo de vida: definição de objetivo e escopo (ver 5.2); análise do inventário da pegada hídrica (ver 5.3); avaliação de impacto da pegada hídrica (ver 5.4); interpretação dos resultados (ver 5.5). Ver figura abaixo.

Um estudo do inventário da pegada hídrica de acordo com esta norma deve incluir as seguintes três fases de avaliação do ciclo de vida: definição de objetivo e escopo (ver 5.2); análise de inventário da pegada hídrica (ver 5.3); e interpretação dos resultados (ver 5.5). Para as organizações, devem ser aplicados os requisitos e orientações adicionais dados no Anexo A. Os resultados de uma análise do inventário da pegada hídrica podem ser relatados, mas não podem ser relatados como uma pegada hídrica.

Uma avaliação da pegada hídrica pode ser realizada como uma avaliação única e individual ou como parte de uma avaliação do ciclo de vida. A pegada hídrica é o resultado de uma avaliação abrangente que gera um perfil de resultados dos indicadores de categoria de impacto. Se ponderação for aplicada, deve ser realizada e relatada em conformidade com a NBR ISO 14044.

Quando se realizar uma avaliação abrangente, deve ser demonstrado que todos os impactos ambientais potenciais significativos relacionados com a água são abordados pelas categorias de impacto selecionadas. A falta de dados não pode ser uma justificativa para não se levar em conta uma categoria de impacto pertinente. Os resultados de uma avaliação da pegada hídrica não abrangente devem ser relatados como pegada hídrica com um qualificador, por exemplo, “pegada de disponibilidade hídrica”, “pegada de escassez hídrica”, “pegada de eutrofização hídrica”, “pegada de ecotoxicidade hídrica”, “pegada de acidificação hídrica “, “pegada hídrica não abrangente”.

O termo pegada hídrica de uma organização sem qualificador deve ser usado apenas quando os inventários de pegada hídrica diretos e indiretos da organização forem considerados em uma avaliação abrangente da pegada hídrica. Convém que, quando existentes, as regras de categoria de produto pertinentes sejam adotadas, desde que: tenham sido elaboradas em conformidade com a NBR ISO 14025, e sejam consideradas apropriadas (por exemplo, para as fronteiras do sistema, modularidade, alocação ou qualidade dos dados) por parte da organização que aplica esta norma.

Ao definir o objetivo de uma avaliação da pegada hídrica, os seguintes itens devem ser indicados de forma inequívoca: a aplicação pretendida, os motivos para a realização do estudo, público pretendido, isto é, para quem os resultados do estudo destinam-se a ser relatados, se o estudo é uma avaliação única e individual ou parte de uma avaliação do ciclo de vida, e se o estudo é parte de uma avaliação do ciclo de vida em que se pretende uma afirmação comparativa.

De 69 países, o Brasil é o penúltimo no ranking de simpatia no atendimento ao cliente

O Target Genius Respostas Diretas é o mais avançado e inovador sistema de perguntas e respostas sobre requisitos de normas técnicas. É, basicamente, um conjunto de perguntas mais comuns sobre determinados assuntos das normas técnicas, acompanhadas das respectivas respostas. Definitivamente, a solução para as dúvidas sobre normas técnicas. Selecione o Comitê Técnico desejado e clique sobre o código ou título para consultar. Acesse o link https://www.target.com.br/produtos/genius-respostas-diretas

Uma pesquisa realizada pela Shopper Experience constatou que, de 69 países, o Brasil é o penúltimo no ranking de sorrisos e simpatia no atendimento. Segundo a empresa, a região brasileira mais séria é a do sul do país. Além disso, outra pesquisa realizada pela empresa Zendesk – desenvolvedora de sistemas virtuais para interação com o cliente – em que inclui 28 países, o Brasil ocupa a 5ª pior posição no ranking de atendimento ao cliente.

O coach de vendas e palestrante, Max Pires, idealizador do treinamento Garçom Vendedor afirma que o atendimento ao cliente é a etapa principal de vendas em uma empresa. “O consumidor decide se vai comprar ou não nos primeiros 10 segundos de conversa com o atendente. Se ele não for recebido com, pelo menos, um sorriso, é muito provável que procurará o seu concorrente”, explica.

Max que é especialista em vendas com formação em programação neurolinguística, diz que embora seja um mito de que a habilidade de vendas é um dom, é também muito importante que os contratantes prestem atenção na personalidade do candidato à vaga de atendimento. “Vender é totalmente estratégico, existem técnicas e habilidades que podem ser desenvolvidas, porém, possuir uma personalidade extrovertida e cortês com certeza facilita o trabalho. Além disso, é extremamente importante que a própria empresa terceirize o treinamento dos funcionários por uma outra especialista no assunto”, aconselha o coach.

Segundo o especialista, o famoso “em que posso ajudar?” já está obsoleto. “Os consumidores hoje tem muito mais acesso à informação e estão muito mais educados sobre os produtos que querem comprar. Ao invés de perguntar em que pode ser útil, o atendente já deve saber identificar as dúvidas do consumidor, para que possa respondê-las antes mesmo de haver perguntas. Todo esse processo de identificar a verdadeira necessidade do cliente, se dá através de uma sondagem poderosa. Só assim o cliente terá a confiança de saber que está sendo tratado de forma especial e que o atendente realmente sabe o que está fazendo. E sempre com um sorriso no rosto”, argumenta Max.

Com tantas opções e alta concorrência, é preciso sempre ter em mente que você não está fazendo um favor ao atender um cliente, e sim, o contrário. “O consumidor que está te fazendo um favor ao comprar ou até mesmo te dar uma oportunidade de vender o seu produto. A partir do momento que o atendente tem a chance de receber um cliente é a hora de ele dar o show! Minha frase preferida é: viver é servir, não vive pra servir não serve pra viver! A venda deve ser encarada dessa forma”, conclui o especialista.

Os coletores para resíduos de serviços de saúde perfurantes ou cortantes

coletores

O Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) pretende colaborar na revisão da NBR 13853 de 05/1997 – Coletores para resíduos de serviços de saúde perfurantes ou cortantes – Requisitos e métodos de ensaio que fixa as características de coletores destinados ao descarte de resíduos de serviços de saúde perfurantes ou cortantes, tipo A.4, conforme a NBR 12808. Não se aplica a coletores destinados ao descarte exclusivo de agulhas.

A ideia visa reduzir os riscos de acidentes durante o descarte, a coleta e o tratamento, corrigindo gargalos da atual norma e conciliando a segurança com as características atuais do mercado brasileiro. O grupo de trabalho, que é orientado pelo Laboratório de Embalagem e Acondicionamento do IPT, faz parte de uma comissão especial da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) coordenada pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (ABES/Seção São Paulo), que conta com a presença de fabricantes de caixas de acondicionamento, fornecedores e coletores de caixas em hospitais, ambulatórios e clínicas, representantes de instituições e sindicatos das áreas hospitalar e farmacêutica, além de órgãos ambientais, reguladores e de proteção à segurança do trabalhador.

Dados apresentados pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), um dos membros do grupo, apontaram que cerca de 21% dos acidentes de trabalho ocorridos na área de saúde estão relacionados ao descarte de materiais perfurocontantes, sendo 5,2% diretamente na manipulação da caixa coletora – unidade básica de descarte com presença obrigatória em hospitais, clínicas (médicas e veterinárias), ambulatórios e farmácias, entre outros estabelecimentos.

“No Brasil, a caixa coletora mais comum é feita de papelão, diferente do resto do mundo, onde são majoritariamente usadas as de plástico”, explica Rogério Parra, coordenador do grupo de trabalho e pesquisador do laboratório do IPT. “Isso gera alguns acidentes recorrentes, relacionados à perfuração da caixa por agulhas e bisturis, à ultrapassagem do limite de enchimento, a dificuldades na montagem da caixa coletora e ao manuseio incorreto dos recipientes, que não podem ser carregados só por uma alça ou molhados, por exemplo”, explica ele.

Atualmente, a norma determina que os coletores devem ser fabricados com as seguintes capacidades nominais: 1 L, 3 L, 5 L, 7 L, 9 L, 10 L, 13 L, 18 L e 20 L. Admite-se a variação de 0% a +10%. O coletor deve ser constituído de material compatível com os padrões de qualidade ambiental, definidos pelos órgãos de controle competentes, quando submetidos aos processos de tratamento e destinação final. Na confecção do coletor não devem ser utilizados materiais halogenados e poliuretanos.

O coletor deve possuir alça (s) ou pegadura (s) que possibilite (m) o manuseio seguro com apenas uma das mãos, não devendo interferir no seu uso normal. A (s) alça (s) deve(m) resistir a uma carga, em quilogramas, numericamente igual a 50% de sua capacidade útil em litros. Quando o coletor não possuir alça (s), deve possuir uma região de pega, de forma que ele fique suspenso, quando ensaiado.

O bocal deve permitir a colocação do material descartado utilizando apenas uma das mãos, sem contato da mão com a parede interna do coletor, com o seu conteúdo ou com o próprio bocal. O bocal do coletor deve ter uma abertura com área máxima de 40 cm² . Se a abertura for circular, o diâmetro máximo é de 7,13 cm.

O coletor deve ser dotado de tampa para fechamento do bocal do coletor, de aplicação fácil e segura, sem a necessidade de materiais complementares à fixação e vedação, de forma a permanecer fechada até o tratamento ou destino final, conforme tratamento estabelecido por órgãos de controle competentes. A tampa deve ser parte integrante do coletor. O limite de enchimento do coletor deve estar localizado 5 cm abaixo do bocal.

O coletor deve apresentar superfície externa de cor amarela e símbolo para material infectante conforme a NBR 7500, com altura mínima de 8 cm. Para coletores com altura inferior a 25 cm, o símbolo deve ter altura equivalente a 1/3 do limite de enchimento. O símbolo deve ser impresso pelo menos duas vezes em local visível, sendo uma na posição frontal.

O coletor deve conter as seguintes inscrições de advertência:

– “ATENÇÃO MANUSEIE COM CUIDADO”, com letras de pelo menos 10 mm de altura;

– “MANUSEIE PELA(S) ALÇA(S)”, com letras de pelo menos 5 mm de altura;

– “CAPACIDADE NOMINAL ___________LITROS”, ______ onde deve ser substituído pelo valor da capacidade nominal do coletor. Para coletores com altura inferior a 25 cm, as letras devem ser reduzidas proporcionalmente.

O coletor deve apresentar uma linha horizontal nítida, em pelo menos 3/4 das faces laterais, indicando o limite máximo de enchimento com a inscrição “NÃO ENCHER ACIMA DESTA LINHA”, imediatamente abaixo da linha. As exigências legais aplicáveis devem estar impressas no coletor. Além das impressões obrigatórias, podem ser impressas as instruções de montagem do coletor, bem como identificação do comprador ou quaisquer outras inscrições de interesse do fabricante, desde que não ultrapassem uma área equivalente a 1/6 da área total das faces. O fabricante do coletor deve informar ao usuário os procedimentos de: montagem; utilização; fechamento; e manuseio.

Segundo Parra, a ideia é que a revisão da norma se apoie em critérios e ensaios técnicos, suporte oferecido pelo IPT, para minimizar situações como essas. As mudanças devem se relacionar ao ensaio principal da norma, que prevê uma força mínima para transfixação de uma material perfurante na caixa – o aumento do coeficiente garantiria uma maior segurança no manuseio da caixa embora, em um primeiro momento, poderia implicar o aumento do custo de produção. Outras discussões giram em torno do limite de enchimento, da produção ou não de uma tampa separada da caixa e da reformulação dos coletores com montagem facilitada.

“É preciso fazer mudanças, mas o objetivo é que os diversos elos da cadeia cheguem a um consenso. Não é possível alterar todo o cenário brasileiro para adequação ao resto do mundo, porque nosso mercado tem suas particularidades”, defende o pesquisador. “O êxito do trabalho será compatibilizar todos os interesses e produzir uma caixa que seja segura para todos, principalmente o trabalhador, e viável para o comprador, já que não pode ser uma caixa muito cara. O IPT subsidia a cadeia fazendo testes, informando como as mudanças dos parâmetros podem afetar as pessoas na prática”.

A revisão da norma, em vigor há mais de 20 anos sem alterações, deve atender não só aos trabalhadores do setor da saúde e a seus fornecedores, mas também à sociedade em geral, desde as pessoas responsáveis pela coleta e destinação correta dos resíduos até aos pacientes e familiares, que por vezes ficam expostos aos riscos de contato com esses coletores em quartos de hospital, enfermaria e ambulatórios médicos – sem treinamento para isso.

“Essa revisão é importante porque a norma permeia o dia a dia das pessoas. Todo local onde a caixa está presente oferece um risco em potencial, porque ela contém resíduos perigosos, possivelmente contaminados por fluidos corporais e portadores de doenças. Se ocorre algum problema no descarte, manuseio ou transporte, qualquer acidente, por mínimo que seja, torna-se grave”, finaliza o pesquisador.

Existem alguns pontos em discussão a respeito da norma NBR 13 853. Quanto à resistência da caixa à transfixação de objetos perfurocortantes, as instituições de saúde, segurança e medicina do trabalho defendem um aumento da resistência à perfuração ou o uso de caixas plásticas. Os fabricantes, fornecedores e compradores apontam para encarecimento dos recipientes caso uma das medidas seja adotada, com risco de soluções mais baratas fora da norma por parte do usuário.

Já o limite de enchimento está presente nas caixas atuais, mas é invisível – o recipiente é feito de papelão e tem a parte superior coberta, apenas com um orifício. Os debates giram em torno de achar uma forma de torná-lo evidente. A alternativa no momento são as caixas de plástico, que são transparentes. Para a caixa de papelão, discutem-se desenhos diferenciados com bloqueios físicos e os aspectos construtivos dos componentes da caixa.

A fixação ou não da tampa à caixa suscita discussões de diferentes naturezas. Alguns atores defendem que a não fixação facilita a perda da tampa ou o contato direto do profissional de saúde com a caixa. Os segmentos de destinação final defendem que isso dificulta o tratamento, porque o coletor não pode ser transportado aberto e,sem a tampa integrada ao recipiente, há risco de improvisação.
Quanto às dificuldades na montagem, alguns consideram a montagem do coletor de papelão muito complexa. Mesmo com o treinamento dos profissionais que manuseiam a caixa, é comum serem encontradas caixas com erro de montagem. Já é consenso no grupo de trabalho que ela deve ser facilitada, visto que este problema pode culminar também em outros, como o excedente ao limite de enchimento da caixa anterior por incapacidade de montar uma nova.

Todas as caixas, por medida de segurança, possuem um número especificado de identificação, que permite rastreá-la e relacioná-la a um comprador, de maneira a responsabilizar aqueles que derem uma destinação incorreta à caixa, junto ao lixo comum por exemplo. Consenso é que a exigência se mantenha. Estão em discussão o conteúdo de mensagens obrigatórias e tamanho dos textos e figuras de advertência.

Em discussão também, a resistência a vazamentos. Mesmo sendo um coletor de resíduos sólidos, uma fração de líquidos, tais como resto de medicamentos e sangue, podem ser descartados junto com os perfurocortantes. Por ser líquidos potencialmente perigosos, o coletor não pode vazar. O teste normalizado é realizado com uma pequena coluna d’água. Normas internacionais não se preocupam com este problema.

A movimentação na unidade geradora causa esforços nas alças e na tampa. A norma deve prever ensaios que simulem estas condições. Por fim, a resistência à compressão. Hoje, as caixas podem ser submetidas a um empilhamento de 2,5 m a 3 m, enquanto aguardam o veículo de coleta. No próprio veículo, são novamente empilhadas. As caixas invariavelmente abrem, contaminam o veículo e podem gerar riscos no transbordo de carga.

Uma alternativa seria que os coletores resistissem a este esforço diretamente, com a introdução de um novo ensaio, como o existente em normas estrangeiras. Outra possibilidade seria a adoção do conceito de conteinerização, ou seja, a presença de instrumentos de contenção no veículo que facilitassem o transbordo e depósito no incinerador, de maneira que a caixa não precisaria ser tão resistente, barateando os custos.

Cidades sustentáveis

Normas comentadas

NBR 14039 – COMENTADA de 05/2005Instalações elétricas de média tensão de 1,0 kV a 36,2 kV – Versão comentada.

Nr. de Páginas: 87

NBR 5410 – COMENTADA de 09/2004Instalações elétricas de baixa tensão – Versão comentada.

Nr. de Páginas:209

Marcus Nakagawa

É possível transformar a sua cidade em mais sustentável? Sim, é possível. Existem vários movimentos para tornar as cidades mais inclusivas, amigáveis, agradáveis, transitáveis, menos impactantes ao meio ambiente, com menos lixo na rua, enfim, um sonho que muitos desejam.

Interessante que, todas as vezes que trocamos ou viajamos para outras cidades, seja no Brasil ou fora dele, conseguimos enxergar coisas boas que não conseguimos ver no nosso dia a dia. Dizem que a grama do vizinho é sempre mais verde, talvez porque cada dia mais estamos vendo o que está do lado de lá, do que do lado de cá. Mais as fotos dos outros nas mídias sociais do que dentro da sua casa.

Na reunião do nosso “condomínio” chamado planeta Terra, em setembro de 2015, os 193 países membros das Organizações das Nações Unidas (ONU) adotaram formalmente os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) com 169 metas para 2030, sendo um destes objetivos referente a Cidades e Comunidades Sustentáveis. Segundo a ONU, seria tornar as cidades e assentamentos humanos inclusivos, resilientes e sustentáveis.

Mas o que seriam estas cidades sustentáveis? Uma parceria da ARCADIS com o Centre for Economic and Business Research (Cebr) lançou em setembro a versão 2016 do Índice de cidades sustentáveis. Por meio de 32 indicadores, os pesquisadores elencaram as 100 cidades globais nas três dimensões da sustentabilidade: planeta, pessoas e prosperidade financeira.

A cidade da Suíça, Zurich ficou no topo da lista com ações bem avançadas como a meta de ter dois mil watts de energia per capita, com investimentos em energias renováveis, prédios com certificações de sustentabilidade, além da mobilidade ser um exemplo para o resto do mundo com todos os tipos de transportes públicos. No topo das 15 mais sustentáveis, estão 13 cidades do velho continente, a Europa.

As cidades asiáticas Singapura (2a do ranking) e Hong Kong (16a) se destacam principalmente pelos índices de prosperidade financeira. São Paulo aparece em 79o, seguido de Buenos Aires e o Rio de Janeiro como 81o com bons índices ligados ao planeta.

Se pegarmos somente um destes indicadores, como os resíduos, existe um movimento que é o Zero Waste, que busca com que as pessoas, empresas e cidades não enviem nenhum lixo para aterro, que aproveitem o máximo reciclando ou ainda fazendo compostagem.

No Brasil, o movimento Lixo Zero é referência pela mobilização e engajamento de alguns grupos empresariais e cidades. Existe uma lista com todas as Zero Waste Municipalities que estão no plano de zerar os seus resíduos, e um bom exemplo é a cidade de Venlo no sul da Holanda. Desde 2006 tem adotado estes princípios de técnicas do “berço ao berço”, ou seja, reutilizar tudo o que é gerado.

Precisamos ficar atentos não só à grama do vizinho, mas como ele deixa a grama verde. Buscar soluções com nossos governantes, e às vezes não só ficar esperando, se juntar aos vizinhos, às ONGs, associações comunitárias e colocar a mão na massa, ou melhor, na Terra.

Marcus Nakagawa é sócio-diretor da iSetor, professor da graduação e MBA da ESPM, idealizador e diretor da Associação Brasileira dos Profissionais de Sustentabilidade e palestrante sobre sustentabilidade, empreendedorismo e estilo de vida www.marcusnakagawa.com

Saiba quem vai ser o seu parceiro neste Carnaval: o governo

O Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) revelou que um dos itens mais consumidos nesta festa, as bebidas, são disparadas as mais tributadas, por exemplo: a caipirinha tradicional (cachaça e limão), tem 76,66% de tributos; seguida pelo chope, 62,20%; pela lata ou garrafa de cerveja, com 55,60%; pela lata de refrigerante, com 46,47%; e a água mineral, com 37,44%, conforme apurou o IBPT.

Aqueles foliões que não abrem mão de sair às ruas fantasiados também contribuem com os altos índices de tributos arrecadados pelo governo, uma fantasia de tecido, tem carga tributária de 36,41%, máscara de plástico, 43,93%; ou confeccionada com lantejoulas, 42,71%; o apito, 34,48%; colar havaiano, 45,96%; o spray de espuma, 45,94% e o confete, 43,83%.

Já o contribuinte que pretende aproveitar o feriado para viajar, não conseguirá escapar da mordida da fera, terá que desembolsar 22,32% de tributos sobre passagem aérea e 29,56% que incidem sobre o valor da hospedagem. Ou ainda quem desejar acompanhar de perto os desfiles das escolas de samba, arcará com até 36,28% em tributos embutidos no valor do pacote que inclui a hospedagem, o ingresso e o transporte até o sambódromo.

O presidente-executivo do IBPT, João Eloi Olenike, assegura que a população brasileira não tem a exata consciência das altas taxas de tributos embutidos nesses produtos. Segundo ele, os legisladores justificam a elevada carga tributária sobre os produtos carnavalescos e de viagens por serem considerados bens supérfluos.

De acordo com o princípio da seletividade, os produtos devem ser tributados de acordo com a sua essencialidade, ou seja, quanto mais importante for para a população, menor deve ser a tributação.

Baseado nessa regra os governos taxam bem mais os produtos considerados supérfluos, artigos de luxo e itens que fazem mal à saúde. E são esses itens, que mais são consumidos nessa época do ano, por ocasião dos festejos momescos. Uma dica importante aos foliões é evitar compras desnecessárias e usar a criatividade e criar roupas e acessórios antigos para curtir a folia e evitar a mordida do leão.

Produto Tributo
Água de coco 34,13%
Água mineral 37,44%
Amendoim 36,54%
Apito 34,48%
Bateria 38,30%
Biquini com lantejoulas 42,19%
Caipirinha 76,66%
Cavaquinho 38,33%
Cerveja (lata ou garrafa) 55,60%
Chope 62,20%
Colar havaiano 45,96%
Confete/ Serpentina 43,83%
Fantasia – roupa com arame 33,91%
Fantasia – roupa tecido 36,41%
Guarda-sol 37,14%
Hospedagem em hotel 29,56%
Mascara de Lantejoulas 42,71%
Mascara de Plástico 43,93%
Óculos de sol 44,18%
Pacote hotel, ingresso e Van – Desfile de carnaval 36,28%
Pandeiro 37,83%
Passagem aérea 22,32%
Preservativo 18,75%
Protetor solar 41,74%
Refrigerante (garrafa) 44,55%
Refrigerante (lata) 46,47%
Sorvete (massa ou picolé) 37,98%
Spray espuma 45,94%

Distanciamento da natureza: os responsáveis somos nós mesmos

O Target Genius Respostas Diretas é o mais avançado e inovador sistema de perguntas e respostas sobre requisitos de normas técnicas. É, basicamente, um conjunto de perguntas mais comuns sobre determinados assuntos das normas técnicas, acompanhadas das respectivas respostas. Definitivamente, a solução para as dúvidas sobre normas técnicas. Selecione o Comitê Técnico desejado e clique sobre o código ou título para consultar. Acesse o link https://www.target.com.br/produtos/genius-respostas-diretas

Teresa Magro

Richard Louv, em seu livro ‘A Última Criança na Natureza’, utiliza o termo “transtorno de déficit de natureza” para definir um fenômeno que estamos cientes há um bom tempo: nosso distanciamento da natureza. E não há motivos para discordar. Por um tempo pensei que fosse o avanço da tecnologia, com toda a sedução e atrativos que fornece a baixo custo e pouco esforço, o responsável por isso. Também pensei que a grande culpada fosse a mídia, divulgando paraísos naturais de difícil acesso para a maior parcela da população. Porém, se pensarmos profundamente, os responsáveis somos nós mesmos.

Como jornalista, Louv sabe a força que as palavras bem colocadas têm. No início, muitas pessoas falaram do assunto nos Estados Unidos, concordando ou criticando, de modo que se expandiu para outros países. O objetivo de disseminar o termo “transtorno de déficit de natureza” foi alcançado, pois ampliou-se uma discussão que  antes estava restrita a poucas pessoas.

Um dos primeiros fatores a serem analisados a respeito dessa questão é se existe a possibilidade do contato com a natureza, seja apreciando o céu em meio à cidade, fazendo uma trilha em um parque ou mergulhando em uma cachoeira. Se isso tudo está disponível e a pessoa não busca maior proximidade é porque ela tem desinteresse ou não aprendeu o quanto o contato com o ambiente natural pode ser prazeroso para sua saúde física, mental e espiritual.

Por outro lado, também há o medo – de ser picada e mordida por animais ou de ser roubada, por falta de segurança em lugares mais ermos. E, atualmente, pode-se dizer que o medo é o maior responsável pelo afastamento das pessoas da natureza.

Além disso, no Brasil, o planejamento urbano carece de espaços para a recreação familiar em contato com a natureza.  Ainda há poucas praças e parques disponíveis para o uso pela população, bem como hortas e jardins comunitários. E o que pode ser feito para mudar isso? Os governos deveriam dedicar um pouco mais de atenção e recursos financeiros para a criação de espaços de uso comum onde a natureza esteja disponível.

Isso vai acontecer quando alguém mostrar a economia que os governantes podem ter evitando ausências do trabalho, pagamento de tratamentos, remédios e internações por falta de contato com o ambiente natural. As escolas também podem, aos poucos, retornar algumas aulas com atividades físicas nas quais as crianças possam ser expostas ao sol. Já há escolas nas quais essas atividades ao ar livre são feitas todos os dias e contribuem para o nível de vitamina D das crianças.

Outro caminho é usar com mais frequência os locais públicos que são adequados para desenvolver atividades ao ar livre. Usando a tecnologia a favor, é possível buscar áreas com vegetação próximas as nossas residências ou trabalho para caminhar, por exemplo. Se o local não for seguro, os vizinhos podem ajudar a exigir ações para melhorar a segurança. As próximas férias também podem ser escolhidas não com base no hotel mais confortável, mas sim onde a natureza esteja presente.

Pensando nisso, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou 2017 como o Ano Internacional do Turismo Sustentável para o Desenvolvimento. A intenção é contribuir com o avanço do setor do turismo, baseado nos três pilares da sustentabilidade (econômica, social e ambiental), e valorizar as riquezas naturais de cada país. É um incentivo para a aproximação com a natureza durante o ano e de levar os benefícios para toda a vida.

Em nosso dia-a-dia, o principal é não sucumbir à sedução da tecnologia que nos afasta cada vez mais de nossa essência humana. Temos que descobrir um caminho mais tentador que nos tire do trecho confortável que vai da poltrona até a porta da geladeira e isso só depende de nós.

Teresa Magro é professora da Universidade de São Paulo (USP) no Departamento de Ciências Florestais e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.