
II Seminário ABQ Qualidade Século XXI
A Target, cumprindo o seu papel de apoiar e incentivar a qualidade, a normalização e a competitividade…
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Filipe de Medeiros Albano e Carla Schwengber ten Caten
As decisões tomadas em ambientes ligados à área da saúde, segurança, meio ambiente, indústria, entre outras, são vinculadas, muitas vezes, a resultados de ensaios ou calibrações. Estas medições devem ser confiáveis, pois um resultado inadequado pode levar a uma tomada de decisão errônea. Dentro deste contexto, está a importância da qualificação dos laboratórios que realizam estas medições. Os mesmos devem ter seus processos estruturados, de forma que seja possível garantir a sua qualidade.
A norma NBR ISO/IEC 17025 aborda sistemas de gestão da qualidade para laboratórios com enfoque em requisitos técnicos e gerenciais. Os laboratórios que obtém acreditação ou reconhecimento com base nesta norma são aqueles que buscam um processo de melhoria contínua e tem uma preocupação com a confiabilidade de seus resultados (ROSA, et al., 2011). Cabe destacar que também se deve observar o fato de que a conquista de uma acreditação é mais simples do que sua manutenção ao longo do tempo (TAWFIK; FATAH, 2010).
Para se qualificar e obter este reconhecimento de terceira parte, no Brasil realizado pela CGCRE/INMETRO e por Redes Metrológicas, por exemplo, o laboratório deve participar de Ensaios de Proficiência (EP), que são programas de comparação de resultados de medições, visando identificar se as empresas envolvidas são tecnicamente competentes nos ensaios ou calibrações que realizam. Alguns autores também chamam esta atividade de comparações interlaboratoriais.
Os EP são desenvolvidos por organismos chamados de provedores. As demandas do mercado por EP são, no Brasil, maiores do que a oferta atual. Além disso, cabe destacar a grande diversidade de ensaios e calibrações existentes, em diferentes áreas da metrologia, o que possibilidade a execução dos mais variados tipos de EP. A partir de 2010, a CGCRE/Inmetro desenvolveu um programa de acreditação de provedores de EP. Esta acreditação é realizada com base na norma NBR ISO/IEC 17043, que aborda questões técnicas e gerenciais ligadas à avaliação da conformidade de provedores de EP.
Devido a crescente demanda de EP no país, os provedores percebem a necessidade de desenvolver projetos para estruturar a oferta de novos serviços para o mercado, além de buscar sua qualificação através da acreditação(THOLEN, 2011). O ambiente de desenvolvimento de projetos dos provedores nem sempre segue todas as recomendações de guias como o PMBOK ou normas como a NBR ISO 10006. Além disso, cabe destacar que os projetos de EP são atividades que demandam certo detalhamento, devido a sua complexidade, fator que justifica um cuidado especial no desenvolvimento de um projeto de um novo EP.
Segundo Keeling (2002), existem alguns benefícios na Gestão de Projetos, tais como: maior facilidade de medição, pois o andamento do projeto pode ser medido por meio da comparação com metas e padrões definidos de desempenho, maior flexibilidade, uma vez que pode empregar ou agregar especialistas e peritos por períodos limitados. Além disso, destacam-se a simplicidade, ligada as metas e objetivos de fácil entendimento, e o controle independente das ações desenvolvidas no projeto e na rotina.
Dentro do tema EP e Gestão de Projetos, encontram-se as seguintes questões de pesquisa: como é realizada a gestão de projetos de EP de provedores acreditados no Brasil? Os provedores utilizam recomendações de guias ou normas de gestão de projetos para desenvolver suas atividades?
O objetivo geral deste trabalho é analisar a gestão dos projetos de EP desenvolvidos por provedores acreditados no Brasil. Como objetivos específicos, destacam-se: avaliar o conhecimento declarado dos provedores sobre as normas NBR ISO 10006, NBR ISO/IEC 17043 e o Guia Pmbok do PMI (i), analisar as áreas de relação (áreas comuns) entre as referências citadas anteriormente (ii), avaliar o nível de maturidade declarado de gestão de projetos de ensaios de proficiência dos provedores acreditados no Brasil (iii) e analisar oportunidades de melhoria na Gestão dos Ensaios de Proficiência desenvolvidos no país (iv).
O presente artigo está estruturado em cinco seções. A primeira é a introdução do tema e identificação da questão e objetivos da pesquisa. A segunda seção aborda o referencial teórico sobre gestão de projetos e EP. Logo após é apresentado o método de pesquisa, sendo divido em quatro etapas. Os resultados da pesquisa são apresentados na seção quatro e na última parte do trabalho são apresentadas as considerações finais da pesquisa.
O referencial deste trabalho está embasado em dois assuntos, a Gestão de Projetos e os Ensaios de Proficiência. A Gestão de Projetos é um esforço temporário empreendido para criar um serviço, um produto ou um determinado resultado. Devido a este fato, ele possui um prazo limitado, uma data definida para a finalização e um resultado diferente daquele produzido em um processo, que caracteriza uma rotina (PMI, 2013).
A gestão de um projeto aborda a execução de 5 processos gerenciais: iniciação, planejamento, execução, monitoramente e controle e o seu encerramento (PMI, 2013). Para implementar projetos, o PMI (2013) propõe ao logo das fases citadas anteriormente a ação integrada de nove áreas de conhecimento, a saber: gestão do escopo, tempo, custos, qualidade, recursos humanos, comunicação, riscos, aquisições e integração. Segundo Gusmão et al. (2006), estas ações são normalmente gerenciadas pelo gerente de projetos, que é a pessoa responsável pela realização das tarefas ligadas ao desenvolvimento do projeto.
Outra referência mundialmente conhecida é a NBR ISO 10006, que trata de sistemas de gestão da qualidade focando em diretrizes para a gestão da qualidade em projetos, apesar de em português utilizar o termo empreendimentos. Esta norma é aplicável a projetos de complexidade variada, pequenos ou grandes, de curta ou longa duração, em ambientes diferentes e independentemente do tipo de produto ou processo envolvido (ABNT, 2006). Ainda, esta norma é apenas orientativa, não sendo utilizada em processos de certificação, como a norma NBR ISO 9001, por exemplo.
Cabe a ressalva de que o tema gestão de projetos é amplo e tem sido desenvolvido em diferentes áreas. Pesquisas de Din et al. (2011) relacionam a gestão de projetos com a certificação ISO 9001, onde se constatou que em empresas certificadas por esta norma, a performance dos seus projetos foram melhores, quando comparadas com empresas não certificadas. Dentro deste contexto foi destacada a importância dos processos de comunicação para a obtenção de um projeto adequado. Autores como Pegoraro, Saurin e Paula (2011) também abordam o uso da gestão de projetos e a importância da comunicação entre os stakeholders, sendo esta prática aplicada com um enfoque de gestão de requisitos de projetos.
Outro autor, Chen (2011), comenta que a abordagem tradicional de gestão e acompanhamento de projetos utilizando marcos de verificação de progresso é insuficiente. Uma forma adequada de permitir que um cliente possa monitorar e intervir no desenvolvimento de um projeto é a abordagem “reuniões de fluxo”.
Esta abordagem está ligada ao fato do gerenciamento das informações durante o projeto ser realizada de forma sistemática e organizada, além de proporcionar um ambiente adequado para implantação e gestão das lições aprendidas. Dentro deste contexto, percebe-se a relevância de um adequado processo de comunicação para uma adequada gestão de projetos.
Outro fator relevante são os projetos e o seu vínculo com a estratégia e o porte da organização envolvida. Atualmente as empresas estão enfrentando mais dificuldades com a implementação de estratégias do que com sua formulação. O trabalho de Meskendahl (2010) examina a ligação entre a estratégia empresarial, gestão de portfólio de projetos, e o sucesso do negócio para fechar a lacuna entre a formulação e implementação da estratégia.
De acordo com a autora, pesquisas anteriores já haviam encontrado algumas evidências de apoio de uma relação positiva entre os conceitos isolados, mas até agora não existe uma lógica relacionando todo o ciclo da estratégia para o sucesso do projeto. Meskendahl (2010) propõe um modelo conceitual de gestão de projetos abrangente, considerando a orientação estratégica, a estruturação de portfólio de projetos, abordando a importância da relação entre gestão de projetos, portfólios e gestão estratégica. Um item primordial para um projeto de sucesso é que estes fatores estejam alinhados.
Sobre a consideração da gestão de projetos vinculada com o porte da organização que o gerencia, pode-se citar a pesquisa desenvolvida por Turner et all. (2010). De acordo com estes autores, as pequenas e médias empresas (PME) fazem uma contribuição fundamental para a economia em termos de emprego, inovação e crescimento.
O gerenciamento de projetos pode desempenhar um papel significativo no desenvolvimento desta contribuição, mas as PME necessitam de formas menos burocráticas de gestão de projetos do que as utilizadas por organizações maiores e mais tradicionais. PME usam o gerenciamento de projeto tanto para gerenciar as operações, para oferecer produtos customizados e para gerir a inovação e o crescimento. Desta forma, percebe-se que a gestão de projetos deve adaptar-se as necessidades das organizações.
Percebe-se a amplitude do tema gestão de projetos e suas diferentes possibilidades de aplicação. No desenvolvimento de EP pode-se fazer uso de conceitos relacionados à gestão de projetos, apesar de não haver uma ligação explicita entre estes fatores, com exceção dos utilizados na área da qualidade. A próxima seção aborda os EP e sua gestão.
Os EP são realizados através de uma sistemática que tem como objetivo apoiar os laboratórios de ensaios e calibração na garantia dos serviços prestados, fornecendo apoio ao SGQ da empresa (HOWERTON et al., 2010). Por meio do EP é possível avaliar o desempenho de laboratórios para ensaios ou medições específicas, identificar problemas analíticos, estabelecer uma comparabilidade de métodos de ensaio ou calibração, prover confiança adicional aos clientes do laboratório, capacitar os participantes com base em resultados das comparações interlaboratoriais, validar a incerteza declarada e atribuir valores para materiais de referência (ABNT, 2011).
As empresas que promovem rodadas de comparação entre laboratórios são chamadas de provedores de EP. Recomenda-se que estas organizações sigam a norma NBR ISO/IEC 17043, que foi elaborada para fornecer uma base consistente a todas as partes interessadas para determinar a competência de organizações provedoras de EP. Atualmente a CGCRE realiza, também, a acreditação de provedores de EP (CGCRE, 2011).
Dentro do contexto de qualificação de laboratórios, destacam-se as exigências relacionadas à garantia da qualidade da norma ABNT NBR ISO/IEC 17025, onde está explicito que o laboratório deve monitorar a validade dos ensaios e calibrações realizados através de um procedimento de controle da qualidade. Tal monitoramento pode ser realizado através de participações em EP (ABNT, 2005).
Em cada EP deve ser definido o desenvolvimento e operação do programa, definindo os possíveis participantes, amostras, frequência do programa, entre outras informações (RMRS, 2011). Destaca-se que um EP pode ser realizado na área de calibração ou ensaios.
Segundo ABNT (2011), os programas de comparação podem variar de acordo com as necessidades do setor em que eles são utilizados, a natureza dos itens de EP, os métodos em uso e o número de participantes. A natureza do ensaio ou medição efetuada em EP define o método de comparação de desempenho que pode ser quantitativo, qualitativo ou interpretativo.
Os EP podem ser classificados em cinco tipos diferentes: sequencial, simultâneos, modelos de níveis distintos, amostras divididas e ensaios parciais (ABNT, 2011). A norma recomendada pela NBR ISO/IEC 17043 para a análise estatística dos resultados é a ISO/DIS 13528 – Statistical methods for use in proficiency testing by interlaboratory comparisons. O método estatístico proposto por esta norma é embasado em um algoritmo para geração de uma média e desvio robustos, uma vez que consiste em um processo de exclusão de valores dispersos (outliers).
O desempenho de cada laboratório participante pode ser avaliado a partir da análise estatística dos resultados enviados, sendo definida a estimativa do valor real (valor designado) através de consenso. O valor designado também pode ser atribuído ao mensurando por um laboratório de referência. Destaca-se que as amostras preparadas também são analisadas através de teste de homogeneidade e estabilidade (ISO/DIS, 2005).
Diferentes pesquisadores destacam a importância da participação em EP. De acordo com estudos realizados por Howerton et al. (2010), foram analisados resultados de EP realizados nos Estados Unidos em laboratórios clínicos de 1994 até 2006 e percebeu-se uma diferença significativa na melhoria dos laboratórios participantes, onde observou-se a redução de resultados insatisfatórios. Neste estudo foram avaliados 36.000 resultados de participantes de EP na área de análises clínicas. Estes EP são aprovados pela Clinical Laboratory Improvement Amendments (CLIA), que é uma agência regulatória da área de saúde Norte Americana.
De acordo com Pizzolato, Reis e Ribeiro (2008), existe um número reduzido de provedores no Brasil, frente à demanda do mercado. Na pesquisa realizada por estes autores, o foco foram os EP da Rede Metrológica RS, que é uma das maiores provedoras deste tipo de atividade no país. De acordo com o estudo conduzido, percebeu-se que existe uma tendência de crescimento da quantidade de laboratórios com resultados satisfatórios no EP de análises microbiológicas da Rede Metrológica RS entre os anos de 2004 e 2006.
Ainda, em relatórios de comparação da Rede Metrológica RS publicados recentemente percebe-se que, ao longo do tempo, os laboratórios tendem a apresentar uma melhoria em seu desempenho analítico. O grupo que participa da comparação melhora sua precisão e exatidão ao longo das rodadas (RMRS, 2011). Isso ocorre em diferentes ensaios e matrizes, a saber: análises ambientais em água, ensaios físico-químicos em vinhos, cachaça e sucos, análise de sementes, análise de carvão, entre outras. Assim sendo, percebe-se a importância dos EP e sua abrangência, pois os mesmos podem ser desenvolvidos em qualquer área que sejam realizadas medições através de ensaios ou calibrações.
A pesquisa desenvolvida, em relação aos seus objetivos, é classificada como sendo um trabalho exploratório que utiliza como procedimento técnico um estudo de caso aplicado através de pesquisas realizadas com provedores de EP. Este trabalho possui uma abordagem quantitativa, sendo de caráter aplicado. O método proposto está embasado em quatro etapas, apresentadas na Figura 1.
Etapa
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Descrição
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1
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Identificação dos provedores acreditados
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Identificar os provedores brasileiros que são acreditados pela CGCRE/INMETRO para esta atividade. Estas organizações devem ser o público alvo desta pesquisa.
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2
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Elaboração do questionário e submissão
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Elaborar questionário para ser enviado aos provedores de ensaios de proficiência com questões relacionadas ao objetivo da pesquisa, como o conhecimento declarado sobre a ABNT ISO/IEC 17043, ABNT NBR ISO10006 e o Pmbok, bem como identificar qual área de conhecimento são aplicadas em EP, além de investigar a maturidade dos provedores e se os mesmos consideram suas atividades como sendo projetos. Os questionários devem ser submetidos por e-mail para os coordenadores técnicos ou da qualidade dos provedores identificados na etapa anterior. Monitorar a devolução dos questionários respondidos.
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3
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Análise dos resultados
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Analisar os resultados da pesquisa que aplicada com os provedores, com foco nos objetivos do trabalho, para tanto, deve-se realizar análises distintas, conforme é indicado nas etapas 3.1 até 3.3.
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3.1
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Análise descritiva
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Analisar o perfil dos provedores, identificando seu número de funcionários, tempo de experiência, configuração da empresa (público ou privada) e área de atuação.
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3.2
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Identificação do nível de conhecimento sobre normas e guias de GP e EP
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Identificar as diferenças entre o nível de conhecimento dos provedores nas normas utilizadas para elaborar os projetos de ensaios de proficiência.
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3.3
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Análise da correlação entre fatores pesquisados
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Analisar a correlação entre as áreas de gestão de projeto estudadas e a percepção dos provedores, buscando identificar associação entre os resultados de diferentes questões da pesquisa aplicada.
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4
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Discussão dos resultados
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Realizar uma discussão geral dos resultados, identificando possíveis oportunidades de melhoria para gestão de projetos de EP. Analisar as relações existentes entre os itens pesquisados, discutir sobre o entendimento da gestão realizada por provedores de EP.
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Figura 1 – Descrição das etapas do método de trabalho
Os resultados da pesquisa podem ser apresentados e estruturados conforme a aplicação do método de pesquisa descrito. A identificação dos provedores, elaboração e submissão do questionário. Durante esta etapa foram identificados os provedores acreditados no sítio do Inmetro, http://www.inmetro.gov.br/credenciamento/acre_prod_ep.asp, onde, no período que a pesquisa foi realizada, que foi de março a junho de 2012, existiam 12 empresas listadas.
Após a identificação dos provedores, foram elaborados questionários com questões sobre o conhecimento do provedor sobre o Pmbok, a NBR ISO10006 e a NBR ISO/IEC 17043. Esta avaliação foi realizada em uma escala Lickert de zero a 5, onde o valor mais alto representa muito conhecimento declarado. Ainda, existiam questões que relacionavam as áreas do Pmbok com as áreas que são abordadas na NBR ISO/IEC 17043 e também sobre quais áreas eram consideradas efetivamente na provisão de um EP. Além disso, questionou-se se o provedor considerava os EP realizados como sendo projetos e também se ele se considerava maduro na gestão de seus projetos ligados aos EP.
O questionário foi submetido para todos provedores acreditados por e-mail, informando que estaria sendo realizada uma pesquisa e que as respostas não seriam identificadas. Após recebimento de todos os instrumentos, foi realizada uma análise das respostas, que está apresentada a seguir.
Análise do perfil dos provedores acreditados
A parte inicial do questionário apresentava perguntas sobre a constituição do provedor, visando identificar seu tempo de experiência, número de funcionários, nível de escolaridade, área de atuação e tipo de empresa (público, privada ou privada sem fins lucrativos). Os perfil destas organizações está apresentado na Tabela 1.
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Tabela 1 – Perfil dos Provedores de EP
A Tabela 1 refere-se aos dados de todos provedores de EP acreditados no Brasil, sendo 12 organizações. O tempo médio de experiência destas empresas é de 12,8 anos, trabalhando com uma média de 13,4 funcionários, sendo que a maioria dos provedores brasileiros são empresas privadas sem fins lucrativos. Destaca-se que apenas 2 empresas acreditadas nesta área são privadas.
A maioria dos provedores (75%) atua na área de ensaios, onde existe uma maior demanda por este tipo de atividade. Ainda, percebe-se que somente 1 provedor atua ao mesmo tempo na área de calibração e ensaios. Sobre o nível de escolaridade, percebe-se que esta é uma atividade que demanda esforço intelectual. Este fato reflete que 41,7% dos provedores tem pessoal com doutorado ou mestrado concluído ou em andamento.
Análise nível de conhecimento sobre Pmbok, ABNT NBR ISO10006 e ABNT NBR ISO/IEC 17043
A próxima fase consistiu na realização de uma análise sobre o nível de conhecimento declarado dos provedores em relação ao guia de gestão de projetos Pmbok, a norma ABNT NBR ISO10006 e a ABNT NBR ISO/IEC 17043. A Figura 2 apresenta os resultados médios das respostas fornecidas pelos diferentes provedores.

Figura 2 – Nível de conhecimento declarado dos provedores
Percebe-se que o conhecimento declarado em relação a norma NBR ISO/IEC 17043 é alto, o que não ocorre para as demais. Aplicando o teste da ANOVA nos resultados, percebeu-se que os fatores estudados apresentam diferença significativa, uma vez que o p-value foi 0,0002. O teste foi realizado com 95% de confiança. Os princípios para realização deste teste, como avaliação da independência e verificação da normalidade dos resíduos, bem como a sua homocedasticidade, foram atendidos satisfatoriamente.
Após a ANOVA, aplicou-se o teste de Tuckey, com 95% de confiança, para verificar qual fator apresentava diferença significativa. Esta avaliação indicou que o Pmbok e a norma ABNT NBR ISO10006 não tem diferença significativa, pois o p-value foi de 0,391. Isso indica que o conhecimento sobre esta norma e sobre o guia são igualmente baixos e significativamente diferentes do conhecimento declarado sobre a norma ABNT NBR ISO/IEC 17043. Desta forma, percebe-se que entre os provedores, todos declararam que possuem conhecimento alto em relação a norma ABNT NBR ISO/IEC 17043 e conhecimento igualmente baixo sobre a ABNT NBR ISO10006 e o Pmbok.
Análise das áreas utilizadas em EP e maturidade de projetos
Os provedores brasileiros acreditados também responderam questões a respeito de quais áreas do conhecimento eles consideravam que a norma NBR ISO/IEC 17043 abordava e quais que o provedor realmente utilizava no desenvolvimento de seus EP. Os resultados desta pesquisa estão apresentados na Figura 3. Foram incluídas as 9 áreas de conhecimento do Pmbok, bem como “estratégia” para verificar se isso era levado em consideração no desenvolvimento dos EP. Entende-se por “estratégia” o alinhamento dos projetos com o planejamento estratégico da empresa (vínculo com seus objetivos, visão, valores e missão).

Figura 3 – Áreas de conhecimento e relação com a norma de EP
Analisando as respostas obtidas, percebe-se que os provedores concordam que estratégia, custos, riscos e tempo são pouco abordados na norma utilizada para o desenvolvimento de EP, uma vez que apresentaram menos de 50% no gráfico 1 da Figura 3. Para avaliação das respostas, elaborou-se uma matriz cruzando as informações do Pmbok, da NBR ISO 10006 e NBR ISO/IEC 17043, apresentada no Apêndice 1.
Nesta matriz, pode-se observar que de fato estas áreas não são abordadas pela norma para desenvolvimento de EP. Outras áreas como integração, avaliando a matriz construída, também não são abordadas de forma explicita na norma NBR ISO/IEC 17.043, apesar de a maioria dos provedores considerarem que a mesma é abordada, pois apresenta 83% no gráfico 1 da Figura 3.
No segundo gráfico elaborado, apresentado na mesma Figura citada anteriormente, são apresentadas as áreas do conhecimento que são consideradas na prática pelos provedores de EP acreditados do Brasil. Mesmo não sendo abordada pela norma de EP, a maioria dos provedores (75%) considera questões ligadas à estratégia para execução destas atividades. Outros fatores que foram citados nesta questão foram custos e tempo, apresentando resultados de 67% e 83%, respectivamente. Percebe-se que custos ainda não são considerados tão relevantes como outras áreas de conhecimento, na prática, como qualidade, comunicação, aquisições, escopo. Na matriz que compara as normas, no Apêndice 1, percebe-se que estas outras áreas são mais consideradas. Essa pode ser uma das justificativas para este fato.
Ainda, na Figura 3, percebe-se que a área mais citada é a qualidade (100%), que já era esperado, devido a esta ser uma norma ligada a avaliação da conformidade, com um foco em qualidade. A menos citada foi Riscos (33%), o que pode representar uma possível área de melhoria para provedores de EP. Destaca-se que as área na matriz do Apêndice 1 que mais e que menos apresentam vínculo com a norma NBR ISO/IEC 17.043 são qualidade e riscos, respectivamente.
As últimas duas questões abordadas na pesquisa foram as que estão apresentadas na Figura 4. A maioria dos provedores de EP considera que suas atividades são desenvolvidas através de projetos (58%). Dentre os entrevistados, 25% citou que considera que são parcialmente desenvolvidos projetos.
A justificativa dos que citaram “parcialmente” foi coerente, uma vez que foi relatado que os EP são projetos a primeira vez que são desenvolvidos. Depois de os mesmos serem validados, muitas vezes com rodadas piloto, eles passam a serem desenvolvidos frequentemente, se tornando processos e fazendo parte da rotina do provedor. Esta lógica permite interpretar que EP que são executados frequentemente, sem mudanças em seu escopo, podem ser considerados processos e não projetos.

Figura 4 – Desenvolvimento de projetos de EP e maturidade de provedores
A maioria dos provedores (83%) se considera madura no desenvolvimento de EP. Os mesmos relataram que este fato está relacionado com alguns fatores, tais como: tempo de experiência em EP, acreditação pela CGCRE/INMETRO desta atividade e a lógica de um processo estruturado de gestão dos EP desenvolvidos. Os 17% que se declararam não maduros estão iniciando esta atividade e ainda possuem menos de cuinco anos de experiência neste assunto.
Análise correlação entre fatores da pesquisa
Os resultados da pesquisa foram cruzados em uma matriz de correlação, que buscou identificar relações positivas ou negativas entre os fatores estudados. As informações que foram correlacionadas foram as respostas sobre: integração, escopo, tempo, custos, qualidade, recursos humanos (RH), comunicação, riscos, aquisições, estratégica, consideração de EP como projetos e a maturidade em projetos de EP.
Para avaliação das correlações todas as respostas foram transformadas em valores quantitativos. Utilizou-se o coeficiente de Pearson e o p-value para avaliar a correlação dos dados. A Tabela 2 apresenta dos dados que apresentaram correlação significativa, com coeficiente de Pearson maior do que 0,60 e p-value menor do que 0,05.
Itens
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Coeficiente de Pearson
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p-value
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Integração – Tempo
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0,77
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0,003
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Integração – Comunicação
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0,77
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0,003
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Tempo – RH
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0,63
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0,027
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Comunicação e Aquisições
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0,67
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0,016
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Tabela 2 – Análise da Correlação significativa
Para os provedores acreditados do Brasil, a Integração entre atividades de iniciação, planejamento, execução, controle e encerramento e a gestão do tempo e a comunicação estão relacionadas positivamente. Ou seja, elas têm interferência, o que é coerente, pois a gestão do tempo do projeto está intimamente ligada a sua adequada integração dos processos de gerenciamento. Além disso, a comunicação é um fator relevante para a adequada integração das atividades.
Outras áreas que apresentaram correlação significativa foi tempo e RH, sendo que de fato a adequada gestão de RH influencia a gestão do tempo, principalmente no sentido de um adequado planejamento e controle das atividades relacionadas com os EP, sendo executados por uma equipe capacitada e bem gerida. Ainda, a Comunicação e as Aquisições apresentaram correlação, que evidencia a importância dos processos de gestão das informações e contato com fornecedores e demais subcontratados em EP.
Das áreas que apresentaram resultados significativos, somente aquisições, comunicação e RH estão explicitamente contemplados na norma NBR ISO/IEC 17.043, mas pelos resultados, percebe-se que existem outros fatores que são relevantes para o desenvolvimento de EP, mesmo que não esteja descritos em seções próprias da norma citada anteriormente. Como uma discussão geral dos resultados, pode-se dizer que a atividade de provisão de EP no Brasil é relevante para o apoio ao desenvolvimento de acreditação e reconhecimento de competência de laboratórios. Atualmente existem poucos provedores acreditados, frente à demanda de EP no mercado.
Os provedores acreditados do país possuem uma alta qualificação em termos de nível de escolaridade. Já a sua experiência e número de funcionários envolvidos com os EP foram variáveis, uma vez que trabalham com 2 a 100 pessoas e as organizações possuem de 2,5 a 35 anos de experiência. O nível de conhecimento declarado em relação a normas e guias de gestão de projetos como o Pmbok e a NBR ISO 10006 foram considerados baixos, quando comparados com a norma NBR ISO/IEC 17043, que é a referência utilizada para o desenvolvimento de EP. Apesar deste fato, percebeu-se que os provedores também utilizam conhecimentos da área de gestão de projetos para desenvolver suas atividades, com exceção de gestão de riscos, que se demonstrou uma das maiores lacunas nas atividades de EP. A área de custos também evidenciou possíveis melhorias. Cabe destacar que ambas não constam na norma ABNT NBR ISO/IEC 17043.
Também foi observado que a maioria dos provedores considera os EP como sendo projetos (58%). Mesmo assim, foi constatado que se o mesmo EP é desenvolvido repetidas vezes, o mesmo passa a ser uma rotina. Desta forma, os provedores desenvolvem um projeto na primeira vez que executam determinado EP. Caso o mesmo seja implantado de maneira adequada, ele poderia ser considerado, caso fosse repetido ciclicamente, como sendo um processo.
Enfim, os EP desenvolvidos no Brasil por provedores acreditados são atividades importantes para o desenvolvimento da Metrologia, tanto na área de ensaios quanto de calibração. O objetivo geral deste trabalho foi analisar a gestão dos projetos de EP desenvolvidos por provedores acreditados no Brasil, que foi realizado de forma adequada. Ainda, foi possível avaliar o conhecimento declarado dos provedores sobre as normas NBR ISO 10006, NBR ISO/IEC 17043 e o Guia Pmbok, analisar as áreas de relação (áreas comuns) entre estas referências e analisar o nível de maturidade declarado de gestão de projetos de EP.
Foi possível identificar oportunidades de melhoria na gestão dos EP desenvolvidos no país, sendo que as maiores lacunas identificadas na gestão dos provedores foras as áreas de riscos e custos. Como sugestões de trabalhos futuros, tem-se propor procedimentos para gestão de custos e riscos em EP, analisando quais práticas seriam aplicáveis para este tipo de atividade e realizar esta pesquisa com outros provedores acreditados de fora do país, visando comparar os resultados entre o Brasil e outras nações. Outra sugestão seria analisar a gestão de projetos de EP com um enfoque estratégico analisando a gestão de portfólio dos provedores.
Referências
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Filipe de Medeiros Albano e Carla Schwengber ten Caten são da UFRGS – filipealbano@yahoo.com.br; carlacaten@gmail.com
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